quinta-feira, 16 de agosto de 2012


5. VIDA PÚBLICA


  Neste capítulo minha atenção estará voltada para os diversos papéis que CJM assumiu na vida pública, consequência da importância que detinha no sistema produtivo local e das características de sua personalidade.  

  Com base nas referências a ele que constam no jornal “Dezenove de Dezembro”, e em outras fontes, é possível avaliar a sua vida pública sob os quatro enfoques seguintes:

  5.1) atuação como membro da Guarda Nacional;
  5.2) atuação política;
  5.3) atuação no âmbito do Poder Judiciário;
  5.4) participação na vida comunitária.


              5.1- Comandante da Guarda Nacional


Batalhão de Fuzileiros da Guarda Nacional- 1840-45 (Fonte: internet)

  A Guarda Nacional, que substituiu os corpos de Milícias e Ordenanças, foi criada por lei em 18 de agosto de 1831, no tempo da Regência, após a abdicação de D. Pedro I, tomando como modelo a Garde Nationale francesa (1). A Regência necessitava de uma força militar confiável, e resolveu por isso apoiar-se nessa instituição, em vez do Exército (onde havia partidários da restauração e mercenários), para assegurar as conquistas então alcançadas. Assim, todos os cidadãos brasileiros entre 21 e 60 anos de idade que pudessem votar nas eleições primárias, ou de 1º grau (i.e. que tivessem renda mínima de cem mil réis anuais, e atendessem às outras exigências definidas na Constituição de 1824) seriam alistados na Guarda Nacional (art. 10). Excetuavam-se os militares do Exército e Armada, os clérigos, os carcereiros e os oficiais de justiça e polícia (art.12).
   
A lei citada, em seu artigo 1º, definiu os objetivos da nova corporação, afirmando que as Guardas Nacionais foram criadas

para defender a Constituição, a Liberdade, Independência, e Integridade do Império; para manter a obediência às Leis, conservar ou restabelecer a ordem, e a tranqüilidade pública; e auxiliar o Exército de Linha na defesa das fronteiras, e costas.

A lei refere-se a “Guardas Nacionais”, no plural, certamente porque elas se organizavam de modo individualizado, por municípios. Eram integradas por seções de companhia, companhias, batalhões e legiões (art. 31).
  
A Regência foi um período de turbulência política, que exigiu atuação da Guarda Nacional em favor da ordem pública, nesses primeiros anos de sua  existência. A Revolta dos Farrapos, iniciada em 1835, e posteriormente, a Revolução Liberal de 1842 — já sob o reinado de D. Pedro II -- foram movimentos ocorridos mais próximos de nós, da 5ª. Comarca da província de São Paulo, que suscitaram o envolvimento da Guarda Nacional.

Segundo o “Dicionário do Brasil Imperial”,

De 1831 a  1850, os cidadãos armados  foram de fato convocados para cumprir a “missão pacificadora”, combatendo as insurreições, sedições, rebeliões, movimentos quilombolas e todo tipo de “desordens” promovidas pelos “inimigos da nação” (2) 

Em 1850, a 19 de setembro desse ano, a lei nº 602 reorganizou a Guarda Nacional. Segundo os estudiosos, enquanto a lei de 1831 tinham um caráter mais liberal e democrático (haja vista que sob sua vigência os oficiais eram eleitos, por “escrutínio individual e secreto”), associado à descentralização do poder, a lei de 1850 reflete o conservadorismo político que prevaleceu após o curto período liberal, posterior a 1831, favorecendo a política centralizadora do Governo Imperial.

De acordo com o Dicionário antes citado, a lei nº 602 suprimiu o sistema eletivo “para os postos mais baixos do oficialato”, que havia até então, mas manteve a indicação do presidente da província ou do governo central para os postos mais elevados. Essa reforma da Guarda Nacional subordinou-a

diretamente ao ministro da Justiça e aos presidentes de província. Assim, a força paramilitar passou a ser submetida em primeira instância às autoridades policiais (nomeadas pelo poder central) e não mais aos juízes de paz. O novo regulamento de 1850 determinou, ainda, a ampliação das exigências de renda para a ocupação dos postos do oficialato, restringindo ainda mais as condições de acesso aos postos superiores da hierarquia militar (3).

Maria Auxiliadora Faria, analisando a bibliografia sobre a Guarda Nacional, distingue três posições a respeito de suas origens e do papel que desempenhou em nossa historia.

A primeira delas vê a corporação como “instrumento político-militar das classes dominantes” que se contrapunha ao Exército e sustentava “militarmente a estrutura econômica do país, fundada no latifúndio e na mão-de-obra escrava”.  Essa é a posição adotada por Nelson Werneck Sodré e outros autores.  Segundo Sodré,

   A Independência, realizada no início da terceira década do século, sofre um processo de ampliação até o início da quarta década e movimento de 7 de abril para, num paradoxo aparente, regredir e encaminhar-se para um conservadorismo seco daí por diante. Criando a Guarda Nacional, em 1831, a classe dominante dos senhores de terras e de escravos ou de servos, numa fase em que travava intensa luta para manter-se no controle do aparelho de Estado, estava forjando o instrumento militar de que necessitava, e empreendendo a neutralização das forças armadas regulares, que seriam relegadas a segundo plano, as de terra particularmente. A partir de 1834, com a lei interpretativa do Ato Adicional, os senhores governam o país, sem peias e sem limites (4).

Maria Auxiliadora afirma que o Ato Adicional, de 1834, representou vitória do pensamento liberal, atribuindo às províncias certa autonomia (criaram-se então as assembleias legislativas provinciais). Mas após cinco anos de Regência tal pensamento deixou de prevalecer. “A lei 105, de 12 de maio de 1840, de Interpretação do Ato Adicional de 1834, retirou da reforma constitucional muito de sua essência liberal”, significando “uma mutilação quase total do Ato Adicional”, que reformara a Constituição de 1824.

A segunda posição enfatiza “o seu processo evolutivo de força civil paramilitar para Milícia eleiçoeira, a serviço do conservadorismo brasileiro”. Para Jeanne Berrance de Castro, um de seus representantes, o caráter eleiçoeiro (sua utilidade como instrumento eleitoral) é adquirido pela disputa política entre liberais e conservadores, que se constituem em partidos no final da década de 1830, aqueles favoráveis à descentralização do poder e estes, à centralização. Raymundo Faoro, outro dos autores incluídos nessa segunda posição, refere-se ao caráter liberal da Milícia em seu início, destacando o “igualitarismo social e racial e, sobretudo, o sistema eletivo na escolha de oficiais”. Mas, segundo ele (nas palavras de Maria Auxiliadora),  

Passada a euforia revolucionária do 7 de abril, corrige-se a "jaça democrática" de sua estrutura organizacional transformando-a em agente da Política Central sob o comando dos Presidentes das Províncias e do Ministro da Justiça. A Lei de reorganização da Milícia em 1850 completa, pois, o sistema centralizador.

A terceira posição salienta o papel da Guarda Nacional como elemento reforçador do poder local. Para Antônio Octavio Cintra,

ao investir nos cargos de coronel, major ou capitão os senhores territoriais e as eminências da aldeia, de acordo com o prestígio e poder desfrutados, e ao confiar-lhes a manutenção da ordem no interior e a ajuda às tropas regulares do exército nos conflitos externos, a Guarda Nacional legitimava-lhes o poder efetivo e lhes dava missão pública.   

Para Maria Isaura Pereira de Queiroz, também classificada nessa terceira posição, “a nomeação de delegados e subdelegados pela Presidência da Província descomprometidos politicamente com os chefes locais não cerceou a autoridade desses chefes”, cujo poder foi reforçado pela Guarda Nacional.

 Segundo Maria Isaura,

a existência da Guarda Nacional em todos os municípios /.../ reforçara muito o poder dos chefes locais. Tinha ela por fim auxiliar o Exército na manutenção da ordem, defender a Constituição, promover o policiamento./.../ Os chefes locais de prestígio recebiam, automaticamente, os postos mais altos da Guarda Nacional; o posto de coronel era concedido ao chefe político da comuna, as patentes de capitão a chefes locais influentes, e o conselho de qualificação, que declarava quem devia servir na reserva e quem ficava isento de servir na Guarda, era composto, em cada município, de eleitores do 2º grau mais votados, sob a presidência do juiz de paz. Era uma arma fortíssima nas mãos dos senhores rurais, não só porque legalmente se tornavam chefes militares, como porque em suas mãos estava mandar este ou aquele servir no Exército; com a Guarda Nacional eram ameaçados os revoltosos contra o mandão local, os adversários. E como o delegado, para efetuar uma prisão, geralmente necessitava do auxílio da Guarda Nacional, que se destinava expressamente a ajudar a manutenção da ordem e promover o policiamento, é claro que não teria força nenhuma contra o mandão local e seus amigos. (5)
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A Guarda Nacional substituiu a Milícia à qual pertenceram o pai e o sogro de CJM: Florêncio José Munhoz (1791-1856) era tenente e João Gonçalves Franco (1777-1853), ajudante de Milícia (“ajudante” equivalia a capitão, na hierarquia militar da época) (6).

CJM tinha 14 anos quando a lei de 1831 criou a Guarda Nacional. Completou 21 em 1838, o que já possibiliaria seu ingresso nela. Mas a referência mais antiga que encontrei de CJM na condição de integrante da Guarda Nacional é de janeiro de 1850 (v abaixo). Ele é chamado de major comandante do Corpo de Cavalaria da Capital. Como a lei nº 602, que reorganizou a força paramilitar, é de 19 de setembro de 1850, chegou a esse posto ainda sob a vigência da lei de 1831.  

Essa lei previa eleição para o posto. Em seu art. 54, ela dispunha que o tenente-coronel chefe de batalhão de infantaria (integrado por 4 a 8 companhias, equivalente ao corpo de cavalaria), o major etc eram escolhidos em assembléia composta dos oficiais, sargentos e furriéis das companhias do batalhão, presidida pelo juiz de paz, em escrutínio individual e secreto. E o art. 62 dizia que as nomeações para os postos de cavalaria (e artilharia) se fariam “em conformidade com as regras estabelecidas para os de infantaria”...

Quanto aos corpos de cavalaria, essa lei afirmava que suas companhias deveriam conter de 70 a 100 praças (art.44). Um corpo de cavalaria poderia ter de 4 a 8 companhias, ou de 2 a 4 esquadrões (art.45). Enquanto um esquadrão, que continha 2 companhias, era comandado por um major, o corpo de cavalaria o era por um tenente-coronel, conforme a lei em questão (art.46).  Mas naquela referência ao major CJM, ainda no tempo da 5ª. Comarca, ele é mencionado como comandante do Corpo de Cavalaria da Capital, talvez ocupando o cargo interinamente... (já vimos antes, na seção 3.4 do cap. 3, que em 1838, conforme levantamento de Daniel Pedro Müller, o distrito de Curitiba possuía 1 esquadrão de cavalaria, com 234 praças. Esse distrito abrangia, além da vila de Curitiba, as freguesias de S.José dos Pinhais e de Palmeira, e as capelas de Votuverava e Campo Largo. CJM foi nomeado, inicialmente, major comandante desse esquadrão de cavalaria, cujo número de praças cresceu com o tempo, transformando-se em corpo de cavalaria na reorganização da Guarda Nacional citada abaixo).   

Em 1854, após a instalação da província do Paraná, CJM integra uma comissão destinada a reorganizar a Guarda Nacional, certamente para ajustá-la à lei nº 602. Uma vez reestruturada, CJM sobe na hierarquia, e passa a ser tenente-coronel comandante do Corpo de Cavalaria da Capital.

David Carneiro nos informa sobre a nova situação da Guarda Nacional (7). Pelo decreto imperial de 5 de fevereiro de 1855, que a reorganizou, ela ficou constituída de um comando geral (“entregue a um comandante superior comum”), três comandos superiores e os comandos de corpos e batalhões.

O primeiro comando superior abrangia Curitiba, São José dos Pinhais e Vila Nova do Príncipe (atual Lapa); o segundo, Paranaguá, Guaratuba, Morretes e Antonina; e o terceiro, Castro e Guarapuava. Foram nomeados seus comandantes, respectivamente, os coronéis Joaquim José Pinto Bandeira, Modesto Gonçalves Cordeiro e Manuel Inácio do Canto.

Um tenente-coronel chefe de Estado-Maior assistia cada um dos três comandantes superiores (o chefe do Estado-Maior do comando de Curitiba era o Dr.José Matias Gonçalves Guimarães). Também tenentes-coronéis eram os comandantes dos corpos e batalhões. Em Curitiba havia dois corpos, um de cavalaria e outro de infantaria. E no litoral (provavelmente), quatro batalhões de infantaria.    

Na capital, o comando do 1º Corpo de Cavalaria coube ao ten-cel CJM e o do 1º Corpo de Infantaria ao ten-cel Manoel Antônio Ferreira. Ambos estavam subordinados ao cel.Joaquim José Pinto Bandeira (1791-1858). Este “sertanista famoso” arbitrou a disputa pela posse dos campos de Palmas e se bateu pela nossa emancipação política. Foi deputado à Assembleia Legislativa de São Paulo, representando a 5ª. Comarca, e depois o primeiro presidente da Assembleia Legislativa Provincial do Paraná (8). Já vimos anteriormente que em 1854 CJM avaliou, junto com Pinto Bandeira e Manoel Antônio Pereira, o problema da falsificação da erva-mate, numa comissão instituída pelo presidente Zacarias para propor medidas destinadas a enfrentar tal problema.

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Uma fonte de informação disponível sobre a comunidade curitibana no período anterior à emancipação política do Paraná (e anterior também ao jornal  “Dezenove de Dezembro”, fundado em 1854)  é o “Boletim do Arquivo Municipal de Curitiba”, dirigido pelo historiador Francisco Negrão, que publicou as atas da Câmara Municipal de Curitiba. Nele se encontram algumas referências a CJM.

  Na ata da sessão da Câmara de 1 de março de 1849 consta que CJM tomou posse e prestou juramento no cargo de 6º suplente de Delegado de Polícia de Curitiba (9). Tinha então 31 anos.

  No ano seguinte, na ata da sessão de 12 de janeiro de 1850 ele é mencionado na condição de major e comandante do Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional. CJM encaminha ofício à Câmara informando aquela condição, que o impedia de tomar posse do cargo de juiz de paz, para o qual fora chamado pelo presidente da Câmara, caso não estivesse impedido (10).

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  A primeira menção a CJM no “Dezenove de Dezembro”, como integrante da Guarda Nacional, é de 1854, nos meses iniciais do governo Zacarias. Segundo o jornal, CJM é “do esquadrão de cavalaria da guarda nacional da capital” e foi escolhido como um dos encarregados de reorganizar a Guarda Nacional da província. Este trabalho deve ter produzido subsídios para o decreto imperial mencionado acima (11).
 
CJM foi nomeado delegado de polícia da capital por uma portaria do presidente da província datada de 26 de junho de 1854, conforme consta num ofício seu ao Conselheiro Zacarias, de 1º de julho desse ano, em que lhe comunica ter prestado o juramento do cargo perante o Juiz de Direito da Comarca (12). O jornal “Dezenove de Dezembro” informa tal nomeação, e também que Bento Florêncio Munhoz (seu irmão) foi nomeado 1º suplente de delegado (13).

Segundo a lei nº 261, de 3 de dezembro de 1841, os delegados eram escolhidos “dentre quaisquer Juízes e cidadãos”, sendo todos “amovíveis (14) e obrigados a aceitar”. Estavam subordinados ao Chefe de Polícia da província, este escolhido dentre desembargadores e juízes de direito. Assim, CJM estava subordinado ao juiz de direito Dr. Antônio Manoel Fernandes Júnior, o primeiro chefe de polícia da província do Paraná, nomeado em 20 de outubro de 1853 por decreto imperial, que exerceu o cargo até 1º de fevereiro de 1855, como informa Ernani C. Straube (15). Veio para Curitiba na comitiva do Conselheiro Zacarias e tomou posse, juntamente com este, em 19 de dezembro de 1853. Segundo o mesmo pesquisador, o delegado de Curitiba era o Dr. Antônio Cândido Ferreira de Abreu, não cabendo portanto a CJM a primazia de ser o primeiro delegado da capital da nova província do Império. Mas dentre os cinco suplentes desse primeiro delegado contava-se João Gonçalves Franco, então sogro de CJM, e também, curiosamente, o futuro sogro, Antônio de Paula Xavier (pai da 2ª. esposa de CJM, D. Narcisa).

A delegacia de polícia da capital abrangia as 6 subdelegacias seguintes: Curitiba, S.José dos Pinhais, Campo Largo, Iguaçu (atual Araucária), Votuverava (atual Rio Branco do Sul) e Palmeira. Essas subdelegacias dividiam-se, por sua vez, em quarteirões (16).  

CJM exerceu a função de delegado de policia da capital por aproximadamente 10 meses, pois um requerimento dele ao presidente Zacarias, datado de 20 de abril de 1855, afirma que não pode continuar nessa condição pela incompatibilidade do cargo com o de tenente-coronel do Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional para o qual foi “ultimamente nomeado”. Por isso pede ao presidente que nomeie seu substituto (17).   
 
De fato, o “Dezenove de Dezembro” de 14 de março desse ano informa que CJM foi nomeado “tenente-coronel, comandante do 1º corpo de cavalaria(18). Estava subordinado a Joaquim José Pinto Bandeira, comandante superior da Guarda Nacional dos municípios de Curitiba, S.José dos Pinhais e Príncipe,  como já foi dito. Após o falecimento de Pinto Bandeira em 1858, esse comandante passou a ser David dos Santos Pacheco (1810-1893), um dos chefes do Partido Liberal no Paraná, deputado na primeira legislatura da Assembleia Provincial em 1854-55 e futuro Barão dos Campos Gerais (19).  

O relatório do vice-presidente Beaurepaire-Rohan citado há pouco, de 1º de março de 1856, apresenta nas p. 66-74 como ficou reestruturada a Guarda Nacional da província, com “o nome de todos os oficiais superiores, promovidos por decreto imperial”. O tenente-coronel CJM é aí mencionado, na condição de comandante do 1º Corpo de Cavalaria, “de 4 esquadrões”, em Curitiba.  

  Em abril de 1858 o presidente da província (Francisco Liberato de Matos) o nomeia comandante superior interino da Guarda Nacional da comarca (20), comando esse que assumiria por diversas vezes nos dez anos seguintes, até ser afastado da corporação, conforme se verá adiante.  Desta vez ele o exerce por quase três meses, passando o comando ao tenente-coronel chefe do estado maior Dr. José Mathias Gonçalves Guimarães (21).

  No ano seguinte, 1859, em agosto, CJM participa por ofício ao presidente da província ter assumido o comando do 1º corpo de cavalaria de guardas nacionais da capital (22). Desde maio desse ano o presidente da província era José Francisco Cardoso, que mais tarde se indisporia com a maioria dos políticos locais e seria considerado persona non grata pela sociedade paranaense, ao encerrar o seu período de governo em 16 de março de 1861, segundo David Carneiro (23). 

  Em setembro da 1860 ocorrem outras menções a CJM na condição de membro da Guarda Nacional, reveladores de sua personalidade, num episódio que pode estar relacionado ao delicado momento político de então, decorrente da atuação conturbada do presidente Cardoso na presidência. Em 22 de setembro, o DD (24) informa que CJM é um dos três tenentes-coronéis da Guarda Nacional (os outros são Manoel Antonio Ferreira e Manoel de Oliveira Franco, este cunhado de CJM) , designados pelo presidente da província “para fazerem parte do conselho de guerra que se vai proceder contra o tenente-coronel comandante do corpo fixo” e outros oficiais, que se encontravam presos. Pela edição de 26 de setembro (25) ficamos sabendo que o presidente da província designou o tenente-coronel Manoel José da Cunha Bittencourt para integrar o conselho de guerra antes referido, em substituição a CJM, “que se acha enfermo”; também o tenente-coronel Manoel de Oliveira Franco é substituído por ter dado “parte de doente”; o mesmo ocorre com o juiz municipal do termo, Dr. Bento Fernandes de Barros (!). É evidente que há aqui, nessa pequena epidemia, uma falsa justificativa desses integrantes do conselho de guerra que certamente não queriam julgar o tenente-coronel comandante do corpo fixo (Manoel Lopes Pecegueiro) e os outros oficiais, por discordarem das razões do Presidente. Além das relações familiares, que interesses comuns, senão políticos (embora a Guarda Nacional fosse, em princípio, apolítica), uniam CJM, Manoel de Oliveira Franco, o juiz Bento Fernandes de Barros e o ten-cel Manoel Lopes Pecegueiro? (sabemos que o juiz era casado com uma filha de Manoel de Oliveira Franco, que por sua vez era irmão da 1ª. esposa de CJM).  Ambos, o juiz e seu sogro, militavam no Partido Conservador, do qual Manoel de Oliveira Franco (1825-1875) era importante liderança provincial, já tendo sido escolhido deputado à Assembleia paulista antes da emancipação do Paraná e depois desta, deputado à primeira legislatura da nossa Assembleia Provincial, e  de outras legislaturas. No futuro (em 1871) ganharia o título de “brigadeiro” por ser nomeado Diretor Geral dos Índios da província. Quanto ao Dr. Fernandes de Barros, nascido no Ceará e formado pela Faculdade de Direito de Olinda, já exercera o cargo de Chefe de Polícia interino em 1859, assumindo posteriormente outras posições importantes.

Como se verá na próxima seção deste capítulo, voltada para a dimensão política da vida de CJM, as relações deste com o presidente José Francisco Cardoso, inicialmente boas, desgastaram-se ao longo de sua gestão. Certamente por isso, Cardoso -- no relatório com que passou a administração da província ao sucessor, em 18 de março de 1861 --  faz um comentário depreciativo a CJM, sem mencionar todavia o seu nome mas apenas o posto que ocupava de comandante do Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Curitiba:

Na deficiência de força para a guarnição da cidade, resolvi chamar a serviço de destacamento um contingente de trinta praças da guarda nacional.
Por ato de 4 de fevereiro último, revoguei o em que foi designado o capitão José Corrêa de Bittencourt para servir de major no corpo de cavalaria.
A anarquia e desordem que se notava neste corpo, os desmandos que diariamente praticava o referido capitão contra os oficiais que se não sujeitavam ao seu capricho, tudo acoroçoado pelo tenente-coronel comandante, que, ao que se diz, animava a discórdia, me levou ao ato referido, com o qual se acalmaram os ânimos (negritei, DVE) (26)

Outro relatório, o do vice-presidente Sebastião Gonçalves da Silva, apresentado à Assembleia Legislativa Provincial em 21 de fevereiro de 1864, inclui em suas páginas um quadro que mostra como se apresentava então a Guarda Nacional da província do Paraná (entre as p. 14 e 15).

Em Curitiba, subordinada ao Comando Superior da Capital, havia um corpo de cavalaria, com 549 guardas (seu comandante era CJM), um batalhão de infantaria, com 663, e ainda um batalhão de reserva, de infantaria, com 943, totalizando 2.155 guardas.

Integravam ainda o Comando Superior da Capital: S. José dos Pinhais, com 763 guardas (1 corpo de cavalaria e 1 seção de companhia de cavalaria), Campo Largo, com 282 guardas (1 esquadrão e 1 seção de companhia, ambos de cavalaria), Iguaçu, com 228 guardas (1 companhia de cavalaria) e Votuverava, com 883 guardas (1 batalhão de infantaria). Em todas essas localidades, os guardas estavam no serviço ativo. Não havia ninguém na reserva.

A Guarda Nacional da província se compunha agora de quatro comandos superiores, os da Capital, Príncipe, Paranaguá e Castro, alcançando um total de 12.277 guardas. Por um decreto do final de 1862, Príncipe, Rio Negro e Palmeira foram desligadas do Comando Superior da Capital, constituindo um novo comando. Assim o da Capital ficou abrangendo, além de Curitiba, S. José dos Pinhais, Campo Largo, Iguaçu e Votuverava, conforme consta acima.

Em maio de 1863, o jornal (27) informa que o tenente-coronel CJM é um dos nove membros integrantes da “comissão paroquial” da Capital, designada para conseguir donativos, comissão essa instituída aqui, assim como em outras localidades, por uma “comissão provincial nomeada pela central da corte, para promover uma subscrição nesta província para as urgências do Estado”. O DD informa sobre a reunião dessa comissão no palácio do governo, presidida pelo presidente da província Antônio Barbosa Gomes Nogueira (e também presidente da comissão provincial) (28). Integra a comissão da capital, além de CJM, o Comendador Manoel Gonçalves de Moraes Rozeira, o Dr. José Cândido da Silva Murici, o Dr. Luiz Francisco da Câmara Leal, o tenente-coronel Benedito Enéas de Paula e outros. O DD de 9 de maio (29) transcreve circular da comissão provincial às comissões paroquiais, e carta da comissão provincial a diversos cidadãos da província promovendo essa subscrição, que decorria de mobilização nacional “para dotar-se a nossa armada de navios encouraçados e de outros meios de defesa que forem precisos, a fim de poder-se fazer resistência a qualquer agressão”. A agressão externa possível naquele momento era a inglesa, pois a mobilização está relacionada à Questão Christie, como ficou conhecida na História do Brasil.   

Essa Questão, segundo o “Dicionário do Brasil Imperial” (30), surgiu em consequência do comportamento arbitrário e arrogante do embaixador inglês William Christie. Inicialmente, ele acobertou, em 1860, os dois ingleses que assassinaram um agente fazendário no Rio de Janeiro. Posteriormente, em 1861, ao saber da fuga dos que tinham pilhado um navio britânico que naufragara na costa do Rio Grande do Sul, acusou o governo imperial brasileiro de negligência. No ano seguinte, 1862, reagiu de forma hostil ao saber da prisão de dois oficiais ingleses, embriagados e em trajes civis. Exigiu satisfações e imediata indenização pelo saque do Prince of Wales, “declarando que passaria a ordenar represálias até que suas intimações fossem atendidas”, o que redundou no bloqueio do porto do Rio de Janeiro e captura de cinco navios mercantes brasileiros. As relações entre o Brasil e a Inglaterra se deterioraram em 1862 e 1863, chegando o governo imperial brasileiro a romper relações diplomáticas com este país. A questão seria arbitrada pelo rei Leopoldo I da Bélgica, que deu ganho de causa ao Brasil em 18 de junho de 1863.   

Ainda em 1863, o ”Dezenove de Dezembro” (31) publica o seguinte despacho da presidência, de 16 de novembro, que na realidade significa uma advertência ao tenente-coronel CJM (o presidente da província era então Sebastião Gonçalves da Silva):

    Ao comandante superior da capital—Declarando-lhe, em resposta a seu ofício datado de 14 do corrente, ficar a presidência ciente dos motivos que apresenta o comandante do 1º corpo de cavalaria da guarda nacional, da capital, tenente-coronel Caetano José Munhós, para explicar a falta que se deu no dia 12, não comparecendo os guardas necessários ao serviço da guarnição. Outrossim, que torna-se preciso que s.s. expeça as mais terminantes ordens para que se não reproduzam fatos dessa ordem, procedendo-se na forma da lei contra os oficiais e guardas que forem remissos.

Em dezembro de 1864 o Brasil entra em guerra contra o Paraguai. E isso condicionará a atuação da Guarda Nacional durante os próximos cinco anos, uma vez que ela, juntamente com os Voluntários da Pátria, terá um papel importante na composição das forças brasileiras envolvidas na guerra, haja vista a situação precária do Exército nacional naquela época. Os Voluntários da Pátria somados aos integrantes da Guarda Nacional responderam por “75% dos efetivos brasileiros no conflito” (32). No caso da província do Paraná, considerando os dados citados pelo presidente Antonio Luiz Affonso de Carvalho em seu relatório de 15 de fevereiro de 1870, p.24 (já no final da guerra), tal percentual foi superior, alcançando 79,4% de seus efetivos, assim discriminados:

-Guardas nacionais designados  1.262
-Voluntários da pátria 432
-Tropa de linha   224
-Recrutas  199                                 
-Outros  17
Total do Exército  2.134

A Armada contribuiu com 118 homens.

No início da guerra, pelo decreto 3.383, de 21 de janeiro de 1865, o governo imperial determinou que a província do Paraná deveria fornecer 416 dos 14.796 guardas nacionais a serem destacados em todo o país “não só para defesa das praças, fronteiras e costas do Império, como para o serviço de guerra no Estado do Paraguai” (33). Por decisão do presidente Pádua Fleury, conforme seu relatório de 21 de março de 1865, o Comando Superior da Capital deveria fornecer 116 dos 416 guardas que couberam ao Paraná. O restante devia ser fornecido pelos outros comandos superiores (Paranaguá, Castro, Príncipe e Guarapuava, este criado mais recentemente) (p.9).

O mesmo presidente informa, em seu relatório de 4 de junho de 1865, que por um decreto desse ano foi reduzido a quatro companhias o 1º corpo de cavalaria da Guarda Nacional da capital (sob o comando de CJM), sendo criado, por outro decreto, o 8º corpo de cavalaria, também com quatro companhias, para o qual foi nomeado tenente-coronel comandante o major Ignacio José de Moraes (p.3).  

No relatório de Pádua Fleury de 15 de fevereiro de 1866, p. 12-13, consta que o efetivo da Guarda Nacional do Paraná era então de 12.298 homens, dos quais 3.643 na capital. Daquele total, 10.446 pertenciam à  força ativa e 1.852 à reserva. A força ativa assim se distribuía: Cavalaria- 6.103; Infantaria- 4.140 e Artilharia- 203. 

Em 5 de novembro de 1866, conforme o relatório do vice-presidente Agostinho Ermelino de Leão dessa data, ainda não se conseguira a mobilização dos 416 guardas nacionais da província para o esforço de guerra, determinada pelo decreto 3.383, de 21 de janeiro de 1865, “não obstante as reiteradas ordens para esse fim expedidas”. A explicação disso é apresentada assim pelo vice-presidente:

 Atribuo essa falta à má designação, à desorganização de alguns dos corpos, à indiferença e má vontade de alguns dos comandantes e daqueles guardas que, esquecidos dos deveres de cidadão, se ocultam vergonhosamente quando o país apela para o seu patriotismo.
 Nenhum dos comandos superiores completou até esta data o número que lhes foi marcado de guardas nacionais designados (p. 7).

David Carneiro afirma que os serviços da Guarda Nacional durante a guerra foram de três tipos:

O dos designados, isto é, daqueles que foram para o teatro da luta; o dos corpos destacados, que foram fazer a guarnição da fronteira e que estiveram sempre prontos para a luta, em caso de ataque; o dos corpos de guarnição fixa, para casos excepcionais possíveis (34)

Com a mobilização das forças de linha para a guerra, o serviço de guarnição da Capital ficou a cargo da Guarda Nacional (35).    

O vice-presidente Carlos Augusto Ferraz de Abreu, em seu relatório de 31 de outubro de 1867, refere-se aos relevantes serviços até então prestados pela Guarda Nacional da província, “já no tocante à guerra, já em relação aos encargos de guarnição e destacamento, já finalmente como auxiliar prestante da polícia”. 

Em 17 de março de 1865 foi criado o 8º Corpo de Cavalaria em Curitiba, já referido (36). Ao 1º Corpo de Cavalaria de Curitiba, comandado por CJM, também pertencia seu irmão major Bento Florêncio Munhoz (37).  Esse corpo já existia, como vimos, desde o tempo da 5ª Comarca, como um esquadrão de cavalaria. 

Em 9 de agosto de 1865, Ordem do Dia do tenente-coronel CJM (38), então no comando superior da Guarda Nacional da capital, apela aos seus comandados para que empreguem todos os recursos visando ampliar o número de Voluntários da Pátria. Isso era uma decorrência, certamente, do Aviso do Governo Imperial de 4 de agosto de 1865 o qual estipulava que “a Província do Paraná deveria contribuir com o mínimo de 800 homens, ou seja 1% de sua população, estimada em 87.491 habitantes” (39).  Segundo David Carneiro,  até o fim do primeiro ano da guerra, o Paraná contribuiu com 1.239 soldados, sendo 517 Voluntários da Pátria, 416 Guardas Nacionais, 221 soldados de linha e 85 recrutas” (40). Como o número total de soldados acima (1.239) corresponde a 1,42% daquela população, a província teria ultrapassado a meta de 1% estabelecida pelo governo imperial. Mas, como vimos, até o final do segundo ano da guerra ainda não haviam sido mobilizados efetivamente os 416 guardas nacionais que couberam à província...

Em 1865, desde 27 de abril até, pelo menos, o final de agosto, CJM exerceu, interinamente, o comando superior da capital (41).  

Pelo decreto imperial nº 3.714, de 6 de outubro de 1866, obtém-se a informação de que a província do Paraná já havia fornecido até aquela data 2.022 homens, chamando-se na oportunidade mais 160 (42). Todavia, muitos guardas nacionais, recrutados contra sua vontade, haviam desertado (43). Por isso, o governo imperial, antes da convocação desse decreto, indultou os desertores.

Em 25 de junho de 1866, CJM estará também no comando interino da capital, pois o DD publica Ordem do Dia sua, dessa data, na condição de tenente coronel comandante do 1º corpo de cavalaria da Guarda Nacional da capital “por S.M. o Imperador” e comandante interino (44). Mas em 27 de julho o comando interino está com o tenente-coronel Francisco de Paula Guimarães. Na Ordem do Dia desta data, publicada no jornal (45), Francisco de Paula Guimarães faz retornar o comando superior da capital a CJM e comunica que obteve do vice-presidente da província (Agostinho E. de Leão, em exercício da presidência) seis meses de licença para tratar da saúde, certamente motivada pelo incidente relatado mais abaixo, ocorrido doze dias antes, em 15 de julho. Afirma na Ordem do Dia:

/.../ ao passar o comando superior ao Sr. tenente-coronel Caetano José Munhós, agradeço a S.S. as maneiras delicadas e honrosas com que me tratou na inspeção de saúde porque passei em sua presença, na qualidade de meu comandante superior interino, devido à grandeza de seu mérito e à forma com que sempre costuma tratar a todos /.../.

No dia 15 de julho o tenente-coronel Francisco de Paula Guimarães, comandante superior interino da Guarda Nacional da capital, foi atacado pelo comandante do batalhão de infantaria de Votuverava, tenente-coronel José Lourenço de Sá Ribas,

o qual tomando as rédeas do animal em que montava o referido comandante superior, não só lhe ameaçara a vida apresentando-lhe um revólver, como ainda descarregaria sobre o mesmo comandante golpes de bastão.

Assim o Chefe de Polícia relata o ocorrido em seu ofício ao presidente da província, conforme o “Dezenove de Dezembro” (46). O despacho presidencial acusa recebimento do ofício e manda o Chefe de Polícia proceder sobre esse caso “as mais enérgicas averiguações”. Em edição posterior do jornal (47), no “Expediente da Presidência” de 26 de julho, consta registro da Resolução designando o tenente-coronel CJM para servir de comandante superior, durante o impedimento do ten-cel Francisco de Paula Guimarães, que obteve seis meses de licença para tratar de sua saúde (mas ele seria reformado, no posto de coronel, por um decreto de 26 de setembro de 1866) (48).

Por aí se vê que as relações entre os tenente-coronéis da Guarda Nacional podiam ser bem inamistosas, sem observância do “esprit de corps”. Infelizmente, as razões que motivaram a desavença entre José Lourenço de Sá Ribas e Francisco de Paula Guimarães não foram publicadas no jornal...

Francisco de Paula Guimarães é citado por David Carneiro como um dos integrantes da Guarda Nacional que participaram da Guerra do Paraguai, e que dela retornaram, “dados por incapazes para o serviço”. Isso deve ter ocorrido logo no primeiro ano da guerra, pois o nome dele não consta na sua relação dos oficiais associados aos diversos corpos e batalhões da Guarda Nacional do Paraná em 1865 (49). Mas o nome do (então) capitão José Lourenço de Sá Ribas consta aí, vinculado à 2ª Companhia do 6º Batalhão de Infantaria, de Votuverava. Segundo Francisco Negrão, José Lourenço de Sá Ribas, nascido em 1820, era filho do cap. Lourenço Pinto de Sá Ribas, antigo presidente da Câmara de Curitiba. Maria Nicolas informa que nesse ano de 1866 ele era deputado à Assembleia Legislativa Provincial. Exerceu vários mandatos, desde o primeiro, no biênio 1854-5, que iniciou as atividades do Poder Legislativo paranaense (50).

Em 5 de novembro de 1866 assumiu o novo presidente da província Polidoro César Burlamaque, do Partido Liberal, que permaneceu no cargo até 17 de agosto de 1867. Nesse ano, a Argentina, aliada do Brasil na guerra contra o  Paraguai,

assoberbada com revoluções internas, se viu obrigada a retirar grande parte dos seus contingentes do teatro da luta, deixando o nosso país na dura contingência de levar a termo sozinho a guerra que se havia iniciado em conjunto (51)

Em consequência, os presidentes de província pedem aos comandantes das Guardas Nacionais mais praças. É o que ocorre também no Paraná. O presidente Burlamaque, após fevereiro de 1867, pede mais 105 praças aos comandos superiores da Guarda Nacional da província (para completar os 333 designados, pois já haviam fornecido 228 praças) (52). O comandante superior interino da Capital era CJM, desde 26 de julho do ano anterior. 

Em 26 de março de 1867 CJM deixa o comando superior interino da Guarda Nacional. Consta na Ordem do Dia de 5 de abril de 1867, publicada no jornal (53), que CJM retorna ao comando do 1º corpo de cavalaria da Guarda Nacional da capital, “por ter deixado o comando superior que interinamente exercia”. Exerceu assim tal comando superior interino, desta vez, de 26 de julho de 1866 a 5 de abril de 1867 (na realidade, até 26 de março, pois CJM entra em licença nessa data, conforme se menciona adiante). Foi portanto nomeado durante a gestão de Agostinho E. de Leão e mantido nos primeiros cinco meses  da gestão do presidente Burlamaque. Durante esse período há algumas outras referências no jornal a CJM nessa condição (54). Curiosamente, o agressor do tenente-coronel Guimarães citado acima passa a ser o comandante da Guarda Nacional em substituição a CJM, conforme despacho do secretário do governo provincial de 28 de março, publicado no DD (55), dirigido ao ten.-cel José Lourenço de Sá Ribas acusando o “recebimento de seu ofício de 26 do corrente, pelo qual participou haver assumido o posto de comandante superior da guarda nacional da capital, por achar-se com licença o tenente-coronel Caetano José Munhós”.

  O relatório do presidente Polidoro César Burlamaque na Assembleia Legislativa do Paraná em 15 de março de 1867 (56) afirma que ele fez seguir para o “teatro da guerra” 219 homens, no período de 5 de novembro do ano anterior até a data do relatório. Destes, 114 eram “guardas nacionais designados”, 86 do exército e 19 da armada. CJM é um dos mencionados na p.4, quando o presidente elogia “a boa vontade, a coadjuvação e concurso eficaz” dos comandantes superiores efetivos coronéis Antônio de Sá Camargo, Antônio Alves de Araújo, José Antônio Pereira Alves e David dos Santos Pacheco, e dos interinos tenentes-coronéis Feliciano Nepomuceno Prates e Caetano José Munhoz, para que alcançasse aquele resultado, no período de pouco mais de quatro meses.

A propósito, esse mesmo relatório, no tópico relativo à Segurança Individual, constata o aumento significativo do número de crimes, especialmente de 1866 em comparação com o ano anterior (houve um aumento de 41,6%) (p.7). Um dos fatores que explicariam isso, para o presidente Polidoro, seria o “terror das designações e do recrutamento” que

afastam dos centros populosos a massa da população em condições de marchar para o Paraguai, --e, longe das vistas das autoridades, os instintos perversos desenvolvem-se /.../ Há lugares onde jazem aglomerados dezenas e talvez centenas de indivíduos, que o  espantalho da guerra atira para longe /.../;  e ali, nessas paragens ínvias, eles armam-se, coligam-se, e permanecem dispostos a resistirem, à mão armada, às diligências policiais.De quando em vez saem fora de seus redutos e vão fazer excursões perigosas nas estradas, à cata de vidas, que  lhes encham o vazio da ociosidade, e de bens, que  lhes matem a fome (p.8)  

No relatório seguinte do presidente Polidoro, ao passar a administração da província ao vice-presidente Carlos Augusto Ferraz de Abreu, em 17 de agosto de 1867, ele afirma que pelo decreto imperial nº 3.809, de 13 de março passado, a província do Paraná deverá fornecer mais 200 guardas nacionais para o serviço da guerra (num total de 8.000 para o país). Polidoro informa também que no espaço de tempo de pouco mais de 5 meses, desde 15 de março, ele conseguiu mobilizar para o esforço de guerra 192 homens, dos quais 118 “guardas nacionais designados”, sendo os restantes provenientes basicamente do exército e da armada. Mas estes últimos não eram da Guarda Nacional. Quer dizer, o disposto no decreto 3.809 não fora ainda cumprido. Donde se supõe que aumentará a pressão sobre CJM por parte dos sucessores de Polidoro na presidência, a fim de que designe guardas nacionais para o esforço de guerra, visando o cumprimento do disposto no decreto citado. 
           
 CJM exerceu ainda mais uma vez o comando superior interino da capital, de 26 de junho até 5 de setembro de 1867, quando transfere o comando para o cel. Manoel Antônio Ferreira, conforme menções feitas a ele no “Dezenove de Dezembro” (57).

 Em 23 de outubro de 1867, José Feliciano Horta de Araújo, que está assumindo a presidência da província, dirige-se à população paranaense para dizer que o “governo imperial /.../ exige de vós mais alguns reforços para o nosso valente exército” (58).

Em seu relatório de 15 de fevereiro de 1868, apresentado à Assembleia Legislativa Provincial, o novo presidente reserva um tópico sobre o “Contingente para a guerra”, referindo-se inicialmente à Guarda Nacional: “Logo que assumi a presidência dirigi-me aos comandos superiores instando por que completassem os contingentes que lhes estavam distribuídos” (p.6). Prossegue afirmando que esses comandos deveriam fornecer mais 404 praças, dos quais 69 deveriam provir do comando superior da capital. Todavia, diz ele, “Era crença geral que a província estava exausta, e não mais podia enviar contingentes para o teatro da guerra”. Mas ele insiste, e consegue a contribuição de (apenas) 34 praças da Guarda Nacional, sendo 14 oriundos do comando superior da capital. Acrescentando os “recrutas apresentados pela polícia”, os voluntários, os aprendizes marinheiros etc, ele chega a um total de 145 praças, relativamente às forças que enviou para o exército e armada durante os quase quatro meses iniciais de sua administração. Conclui esse tópico afirmando que a província do Paraná já contribuiu, desde o começo da guerra, com 1.850 homens para o exército e a armada.           

Causa estranheza, dados os antecedentes antes apontados (a boa relação de CJM com o presidente Polidoro Burlamaque, do Partido Liberal e a dificuldade de mobilização de guardas nacionais para o esforço de guerra), a atitude hostil desse novo presidente com relação ao tenente-coronel CJM, consubstanciada na resolução abaixo transcrita. Ela é explicada talvez mais pela conjuntura política da época do que pela resistência de CJM em designar novos guardas nacionais. No governo central, a época era de domínio liberal, ou melhor progressista (mas os conservadores retornariam ao poder em 16 de julho de 1868, quando assume o gabinete do Visconde de Itaboraí). CJM vinculava-se na prática aos conservadores, enquanto Horta de Araújo pertencia ao Partido Liberal, como Burlamaque, e antecessores, desde 1864. Mas Horta de Araújo era um “liberal extremado” desde os tempos acadêmicos, na opinião de David Carneiro (59).

Segundo José Murilo de Carvalho, já desde 1866 os liberais históricos integrantes do Partido Progressista “começaram a se organizar e a elaborar um programa mais radical”. Em 1868 fundam o Clube Radical e divulgam seu programa. Nesse mesmo ano, dissolve-se o Partido Progressista, com a queda do gabinete Zacarias. Vários pontos desse programa mais radical de reformas vai ser assimilado pelo novo Partido Liberal, que se organiza no ano seguinte, reforçado com egressos daquele Partido.  Um desses pontos é o da extinção da Guarda Nacional, apontada como um dos males da situação vigente como o Senado vitalício e a escravidão. Horta de Araújo já devia ter essa predisposição contrária à corporação paramilitar antes de vir para o Paraná... (60)

Na edição do “Dezenove de Dezembro” de 4 de março de 1868 (61), sob o título “Governo Provincial” , consta o seguinte:

   O presidente da província considerando que, não obstante as ordens expedidas desde 24 de outubro do ano findo e reiteradas em 26 do mesmo mês e 27 de janeiro deste ano, o comandante do 1º corpo de cavalaria da guarda nacional, Caetano José Munhós, não só deixou de completar o contingente exigido do corpo sob seu comando, como não apresentou durante todo aquele tempo um só guarda nacional designado (o negrito é meu, DVE), tendo além disso se abstido de dar qualquer razão que possa justificar o seu procedimento, resolve, usando da atribuição que lhe confere o decreto nº 3506 de 4 de agosto de 1865, suspendê-lo do exercício do seu posto por tempo indeterminado.
                      Façam-se as precisas comunicações.
Palácio da presidência do Paraná, em 3 de março de 1868.
José Feliciano Horta de Araújo.

Alguns dias depois, na edição de 7 de março (62) consta decisão do presidente que atingia também o irmão de CJM, que compartilhava seus interesses econômicos e políticos:  

   O presidente da província considerando que tendo sido ordenado ao major Bento Florêncio Munhós que assumisse o comando do 1º corpo de cavalaria da guarda nacional, deixou ele de o fazer alegando achar-se doente, pelo que sendo submetido a inspeção, foi pela junta de saúde julgado apto para o serviço ativo, por não sofrer de moléstia alguma nem ter defeito físico, donde se evidencia que o dito oficial recusou-se, sem motivo justificado, ao serviço que lhe cumpria desempenhar, resolve, usando da atribuição que lhe confere o decreto nº 3506 de 4 de agosto de 1865, suspendê-lo do exercício do seu posto por tempo indeterminado.
Façam-se as precisas comunicações.
Palácio da presidência do Paraná, em 7 de março de 1868.
José Feliciano Horta de Araújo.

Consultando o acervo do Arquivo Público estadual, localizei um ofício de CJM dirigido ao presidente Horta de Araújo, datado de 26 de março de 1868, logo depois, portanto, deste suspendê-lo do exercício de seu posto da Guarda Nacional. CJM, sobranceiramente, lhe encaminha “uma petição com os documentos juntos para que se digne levá-los à presença do Governo Imperial com as informações que V.Exa. julgar precisas e entender de justiça” (o gabinete era então chefiado pelo cons. Zacarias de Góes e Vasconcelos, o primeiro presidente da província do Paraná, com quem CJM tinha boas relações). Infelizmente não consta ali cópia dessa documentação anexada ao ofício, que nos permitiria conhecer a argumentação de CJM em sua defesa, relativamente às razões expostas pelo presidente Horta de Araújo para tomar aquela decisão.
  
Mas nesse mesmo acervo consta um outro documento que nos permite compreender um pouco a situação enfrentada por CJM, que era análoga à do seu colega, o tenente-coronel Ignacio José de Moraes, comandante do 8º Corpo de Cavalaria da Capital. O tenente-coronel Moraes, em ofício datado de 11 de novembro do ano anterior e dirigido ao seu superior hierárquico, o coronel Manoel Antonio Ferreira, comandante da Guarda Nacional da capital, expõe “as razões por que não tem completado os contingentes exigidos para o serviço da guerra”. O coronel Ferreira, por uma circular de 26 de outubro de 1867, lhe dera prazo de 15 dias “para a remessa das praças que tem esse Comando de formar para o serviço da guerra”. No término do prazo, o tenente-coronel Moraes no ofício referido diz que tomou as providências necessárias para cumprir essa determinação. Afirma que expediu “terminantes ordens” aos seus comandados (comandantes das companhias integrantes de seu corpo de cavalaria) “para que apresentassem cada um o número de praças que lhes marquei”. Mas em resposta eles lhe declararam

que empregaram todos os esforços para o cumprimento das ordens, mas que nada puderam conseguir em razão dos guardas de há muito tempo acharem-se refugiados pelas matas não se podendo mandar escoltas sobre eles por não se encontrar um só guarda de que se possa lançar mão para isso.

As razões alegadas por CJM não deveriam ser muito diferentes dessas...

Já o Conselheiro Zacarias, em seu relatório à Assembleia de 8 de fevereiro de 1855, p. 20, constatara a “quase nenhuma inclinação ao serviço das armas” por parte dos habitantes da província... 

O governo imperial estabeleceu metas para a mobilização de praças da Guarda Nacional visando reforçar os nossos contingentes envolvidos na guerra do Paraguai. A necessidade de pessoal aumentou em 1867, como já foi dito, quando a Argentina, nossa aliada no conflito, retirou dele suas forças, tendo em vista as revoluções internas que enfrentava. Como o número de voluntários na Guarda Nacional ficava aquém da meta estabelecida, a diferença era preenchida pela mobilização compulsória de praças, os chamados “designados”, o que explica inclusive os casos de deserção ocorridos, segundo David Carneiro (63).  

CJM assim, ao não enviar homens da comunidade curitibana para a guerra, não se valendo da prerrogativa de “designar” guardas nacionais seus subordinados, podia estar desobedecendo as determinações governamentais e militares -- o que justifica sua punição -- mas revelava com essa atitude uma personalidade pouco autoritária, a quem repugnava obrigar os subordinados a fazer o que não queriam. Preferiu deixar essa decisão para o foro íntimo deles, como ocorreu aliás com os voluntários, oriundos do seu 1º Corpo de Cavalaria. Dentre esses, que passaram a integrar os corpos da guarnição de fronteiras, David Carneiro cita os alferes Manoel José da Cunha Bittencourt, Manoel Elias de Souza Ataíde e Antonio Enes Bandeira. O cap. Luiz Manoel Agner também se apresentou como voluntário e integrou um corpo de guarnição de fronteira. Mas ele provinha do outro Corpo de Cavalaria da Capital, o 8º, sob o comando do já citado Ignacio José de Moraes. Luiz Manoel Agner foi, como vimos, o segundo a instalar engenho de mate movido a vapor em Curitiba.   


Presidente José Feliciano Horta de Araújo
(Fonte: Carneiro, David- "História do Período Provincial do Paraná". Curitiba: Banestado, 1994-p.201)

Horta de Araújo exerceu seu mandato até 29 de maio de 1868 (64).  Em 10 de julho desse ano, despacho de seu sucessor na presidência ao comandante superior da capital determina “a expedição de ordem a fim de ser dispensado temporariamente do serviço da guarda nacional o 2º escriturário da tesouraria geral tenente Alfredo Caetano Munhós”, filho primogênito de CJM  (65).   Exercia a presidência da província nessa época o vice-presidente Carlos Augusto Ferraz de Abreu (vinculado ao partido Conservador). E em 22 de janeiro de 1869, outro filho de CJM, Caetano Alberto, “tenente cirurgião do 1º corpo de cavalaria”, obtém do presidente Antônio Augusto da Fonseca oito meses de licença “para tratar de seus negócios dentro da província” (66). Alfredo e Caetano Alberto solidarizam-se assim com o pai, como já o fizera seu irmão.

O presidente A.A. da Fonseca, em seu relatório de 6 de abril de 1869, p.6, mostra que CJM e seu irmão não foram os únicos a serem atingidos pela pena de suspensão naquela época (como  vimos, CJM foi suspenso em 3 de março de 1868, e Bento Florêncio no dia 7 do mesmo mês e ano). O presidente Fonseca afirma que entre 7 de setembro de 1868 e 31 de janeiro de 1869, suspendeu 1 coronel comandante superior e 1 tenente-coronel chefe do estado-maior, posteriormente portanto à suspensão  de CJM e  seu irmão. Nesse período, também demitiu 1 coronel comandante superior e 3 tenentes-coronéis. Antes disso, entre 1º de agosto e 7 de setembro de 1868, Fonseca já havia demitido o comandante superior de Paranaguá, coronel José Antonio Pereira Alves, substituindo-o por Manoel Antonio Guimarães (o futuro Visconde de Nácar), refletindo a mudança política ocorrida no país, pois desde 16 de julho de 1868 os conservadores haviam retornado ao poder, com o gabinete do Visconde de Itaboraí.

O coronel J.A. Pereira Alves (1818-...), segundo Francisco Negrão, era “Prestigioso chefe do Partido Liberal” em Paranaguá. Além de comerciante, tinha aí “importante fábrica de sabão e velas”. Fundou a Colônia Pereira e outras (67). Aliás, para o presidente Rodrigo Octavio de Oliveira Menezes, “excluídas as máquinas em que se prepara o mate”, essa fábrica de Pereira era a única existente na província, pois o setor era dominado por “indústrias primitivas e domésticas” (68).

Com o retorno dos liberais ao poder, o cel. J. A. Pereira Alves reassume, em 3 de agosto de 1878, seu comando da Guarda Nacional de Paranaguá e Guaratuba (e também o cel Antonio Alves de Araújo, o de Antonina e Morretes) (69).

É interessante mencionar ainda que, dada a sua capacidade econômica, o cel. J. A. Pereira Alves foi encarregado do serviço da conservação da estrada da Graciosa pelo presidente Carlos Augusto de Carvalho, recebendo em contrapartida 13:316 $000 da província a cada dois meses (cf relatório desse presidente de 1º de outubro de 1882, p. 62).

Os quadros anexos ao relatório do presidente Antonio Augusto da Fonseca de 6 de abril de 1869, antes citado, mencionam os nomes dos comandantes superiores então demitidos, com a ascensão dos conservadores ao poder (coronéis J.A. Pereira Alves e  A. Alves de Araújo, chefes do Partido Liberal em Paranaguá e Antonina, respectivamente, já referidos). Constam também, nesses anexos, os nomes dos oficiais que foram suspensos da Guarda Nacional desde 1º de fevereiro de 1868 até a data do relatório, a saber: CJM, seu irmão major Bento Florêncio, o tenente-coronel Manoel Antonio de Andrade -- também do 1º Corpo de Cavalaria a que pertenciam CJM e seu irmão, o tenente-coronel Benedicto Enéas de Paula, chefe do Estado Maior (sogro do político liberal Generoso Marques dos Santos), todos da Capital, além do coronel Bonifácio José Baptista, comandante superior de Castro, e do tenente-coronel Manoel da Cruz Carneiro do 6º Corpo de Cavalaria do Príncipe.

A citação abaixo, relativa ao problema do não preenchimento das metas do governo central para o esforço de guerra, mostra que o presidente Antonio Augusto Fonseca foi menos rigoroso que seu antecessor Horta de Araújo, relativamente aos comandantes da Guarda Nacional que não designaram praças para cumprir aquelas metas. Enquanto CJM foi punido por não designar ninguém em pouco mais de 4 meses (de 24 de outubro de 1867 a 3 de março de 1868), Fonseca aguardou mais de 7 sem obter designações e nenhum comandante foi punido por isso. A explicação naturalmente reside no fato de que eles eram seus aliados políticos, o que não devia ser o caso de CJM e seu irmão relativamente ao presidente Horta de Araújo.

Diz Fonseca em seu relatório de 1º de setembro de 1869, p.8, ao deixar o governo:

Em data de 11 de janeiro expediu-se circular aos comandantes superiores para que sem demora mandassem proceder a designação dos guardas nacionais que faltam para preencher os contingentes distribuídos aos diversos comandos superiores, expedindo-se nessa ocasião instruções para a designação.
Em data de 26 de junho expediu o ministério da justiça aviso determinando que na designação se observasse o decreto nº 3.506 de 4 de agosto de 1865.
Não tendo os comandantes superiores da guarda nacional apresentado designado algum, reiteraram-se a 26 de junho as ordens expedidas, estranhando-se não terem dado execução àquela ordem e nem apresentado a razão do seu não cumprimento.
Em virtude desta última circular, participaram alguns comandantes superiores que estavam procedendo à designação: até agora, porém, não é conhecido o resultado de seus esforços.


O “Dezenove de Dezembro” publica a seguinte nota em outubro de 1869 (70) relacionada a CJM, um ano e meio após a sua suspensão da Guarda Nacional: 

   Por decreto de 15 do mês passado (i.e., 15 de setembro de 1869) foram demitidos do exercício de seus postos os Srs. tenentes-coronéis Caetano José Munhós e Ignacio José de Moraes, aquele comandante do 1º e este do 8º corpo de cavalaria desta província.

O presidente em exercício (que assumira em 28 de agosto de 1869) era o vice-presidente Agostinho Ermelino de Leão, radicado na terra, que devia ter boas relações com CJM, pois nomeou-o, em 1866, comandante superior interino da Guarda Nacional e contratou, nesse mesmo ano, seu filho Caetano Alberto como colaborador da secretaria da presidência. Em 1870 vai nomear CJM juiz municipal substituto. Com esse decreto de demissão, talvez atendesse à vontade do próprio CJM, que assim se desvinculava definitivamente daquela organização paramilitar.

Naquela mesma data, CJM e Moraes foram substituídos, respectivamente, pelos tenentes-coronéis José Corrêa de Bittencourt e Paulino de Oliveira Franco, este irmão da 1ª esposa de CJM (71).

O tenente-coronel Ignacio José de Moraes, referido acima quando abordei seu ofício em que apresenta justificativa por não ter conseguido mobilizar praças para o serviço de guerra, também fazia política. Em 1876 pertencerá a uma ala dissidente do partido Liberal (cf. as Notas da seção 5.2 deste mesmo capítulo). Será, no futuro, um dos dois avaliadores do espólio de CJM. Quando faleceu, em 1879, aos 70 anos, foi elogiado em uma nota de “O Paranaense” de 12 de junho de 1879, p.4, órgão do Partido Conservador, nestes termos:

Nosso adversário, embora, somos os primeiros a reconhecer do quanto era alto e eminente aquele espírito. Faleceu legando à família um nome imaculado e uma reputação que nunca foi posta em dúvida.


Após a Guerra do Paraguai, encerrada em 1870, verifica-se o fortalecimento do Exército e a perda de importância da Guarda Nacional como força militar. A respeito disso, Maria Auxiliadora Faria, em seu estudo antes referido, afirma o seguinte:  

   A promulgação da Lei 2.395 de 10 de setembro de 1873 destituindo-a de forma quase definitiva das funções militares, legitima o seu papel como força política. A utilização da Guarda pelos grupos oligárquicos como instrumento político será a partir de então, uma constante, e a descentralização político-administrativa implantada no país com o 15 de novembro facilitará o seu uso como instrumento de reforço do poder local. O papel desempenhado pela Guarda Nacional no regime Republicano adquire, no entanto, caracteres muito especiais e só pode ser entendido se relacionado ao mandonismo local dos "coronéis".



NOTAS


(1) FARIA, Maria Auxiliadora-- “A Guarda Nacional em Minas (1831-1873)”- dissertação de mestrado apresentada à Universidade Federal do Paraná, disponível no link abaixo: 
O Anexo 1 da dissertação transcreve a lei de 18 de agosto de 1831, que criou a Guarda Nacional, o Anexo 4, a lei nº 602, de 19 de setembro de 1850, que a reorganizou, e o Anexo 6, a lei nº 2.395, de 10 de setembro de 1873, que alterou a lei nº 602.

(2) VAINFAS, R. (org)- “Dicionário do Brasil Imperial”, op cit, p. 318.

(3) Ibid., p.320

(4) SODRÉ, Nelson Werneck—“História Militar do Brasil”- op cit, p. 117

5) Apud SODRÉ, Nelson Werneck—“História Militar...”, op cit, p. 131-2

(6) “Novo Dicionário Aurélio”- op cit, p. 724 (verbete: “Hierarquia”)

(7) CARNEIRO, David-- “O Paraná na História Militar do Brasil”- op cit, p.179-181

(8) Ibid., p. 181-4; v. também p. 195.

(9) “Boletim do Arquivo Municipal de Curitiba”- v. 56, p. 70

(10) Ibid.-  v. 57- p.8

(11) DD de 6.05.1854 (?) ou 29.04.1854 (?)- p. 6

(12) O ofício de CJM ao presidente Zacarias, datado de 1º.07.1854, encontra-se hoje no Arquivo Público do Estado, onde o consultei.

(13) DD de 15 de julho de 1854, p. 2

(14) Amovível: “Suscetível de remoção, de transferência”  (dic. Aurélio)
  
(15) STRAUBE, Ernani C.-- “Polícia Civil: 150 anos”- op cit, p. 56, 257-8 e 270-1

(16) Cf quadro nº 8—“divisão policial”, anexo ao relatório do vice-presidente Beaurepaire Rohan apresentado na abertura da Assembleia Legislativa Provincial em 1º de março de 1856   

(17) O requerimento de CJM ao presidente Zacarias, datado de 20.04.1855, encontra-se hoje no Arquivo Público do Estado, onde o consultei.
    
(18) DD de 14.03.1855- p. 2

(19) Relatório do presidente Francisco Liberato de Mattos na abertura da Assembleia   Legislativa Provincial em 7.01.1859, p.7; “Dicionário Histórico-Biográfico do Estado do Paraná, op cit, p. 328-9; NICOLAS, Maria- “130 Anos de Vida Parlamentar Paranaense 1854-1984”- op cit,  p. 59 e 63.

(20) DD de 10.04.1858- p. 2

(21) DD de 3.07.1858- p. 3. O Dr. José Mathias Gonçalves Guimarães era formado pela Faculdade de Direito de São Paulo e casado com uma filha do Visconde de Nácar, segundo CARNEIRO, David--“O Paraná na História Militar do Brasil”, op cit, p.186.
  
(22) DD de 27.08.1859- p.2

(23) CARNEIRO, David- “História do Período Provincial do Paraná”, op cit. Essa foi também a fonte utilizada das informações relativas aos períodos de governo dos diversos presidentes da província do Paraná.

(24) DD de 22.09. 1860- p.2 e 4

(25) DD de 26.09.1860- p.1 e 2

(26) Relatório que o presidente José Francisco Cardoso apresentou ao Dr. Antonio Barbosa Gomes Nogueira em 18.03.1861, ao lhe passar a administração da província- p. 20. --José Corrêa de Bittencourt é citado também como integrante do 1º Corpo de Cavalaria da Guarda Nacional de Curitiba, sob o comando do tenente-coronel CJM, em CARNEIRO, David—“O Paraná na Guerra do Paraguai”- op cit, p.198. -- “Acoroçoar”: estimular; encorajar; induzir, instigar (dic. Aurélio)

(27) DD de 6.05.1863- p.4

(28) DD de 9.05.1863

(29) DD de 9.05.1863, p.3-4

(30) VAINFAS, R. (org.)- “Dicionário do Brasil Imperial”- op cit, p. 603-604

(31) DD de 5.12.1863- p.2

(32) VAINFAS, R. (org.)- “Dicionário do Brasil Imperial”- op cit, p. 325

(33) O decreto imperial nº 3.383, de 21.01.1865, está disponível em http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=102594&tipoDocumento=DEC&        tipoTexto=PUB  (acessado em 12.12.2011)

(34) CARNEIRO, David—“O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p. 207

(35) Ibid., p. 230

(36) Ibid., p. 204

(37) Ibid., p.198

(38) DD de 12.08.1865- p.4

(39) “Dicionário Histórico-Biográfico do Estado do Paraná”, op cit, p. 201

(40) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p.259

(41) DD de 26.08.1865- p. 2. Cf. também DD de 26.06.1865- p. 4 e DD de 8.07.1865- p.4

(42) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p.209

(43) Ibid., p. 210

(44) DD de 27.06.1866- p.4

(45) DD de 28.07.1866- p.3

(46) DD de 4.08.1866- p. 2

(47) DD de 11.08.1866- p. 2

(48) Cf. relatório do presidente Polidoro César Burlamaque de 15.03.1867, p. 16.

(49) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p.224 e 197-204

(50) NEGRÃO, Francisco – “Genealogia Paranaense”-v.II, Curitiba, 1927, op cit, p. 446; NICOLAS, Maria—“130 Anos de Vida Parlamentar Paranaense 1854-1984”, op cit.

(51) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p. 211

(52) Ibid., p. 212  

(53) DD de 6.04.1867- p.4

(54) DD de 15.09.1866- p.3; DD de 19.01.1867- p.4;  DD de 22.08.1866- p.1

(55) DD de 10.04.1867- p.2

(56) O DD de 13.04.1867- p. 2 inicia a publicação do relatório citado do presidente Polidoro César       Burlamaque, que abriu a 2ª sessão da 8ª legislatura da Assembleia Legislativa da província do Paraná.

(57) DD de 29.06.1867- p.4;  DD de 10.07.1867- p.4;  DD de 7.09.1867- p.4

(58) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p.223

(59) CARNEIRO, David-- “Galeria de Ontem”. Curitiba: Editora Vanguarda, 1963- p.456

(60) CARVALHO, José Murilo de--  “A Construção da Ordem/Teatro de Sombras”. 2 ed. rev. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, Relume-Dumará, 1996- p.185-187
  
(61) DD de 4.03.1868- p.1 e 4

(62) DD de 7.03.1868- p. 1

(63) CARNEIRO, David-- “O Paraná na Guerra do Paraguai”, op cit, p. 73, 187 e 194

(64) DD de 15.07.1868- p. 1 (“Expediente da Presidência”)

(65) DD de 29.07.1868- p.2

(66) DD de 13.03.1869- p.2

(67) NEGRÃO, F.- “Genealogia Paranaense”, op. cit, v.III- Curitiba,1928- p. 64;  v.VI, Curitiba, 1950-p. 265 

(68) Relatório do presidente Rodrigo Octavio de Oliveira Menezes de 9.04.1878, p. 4. Alguns anos depois, o presidente João José Pedrosa, em seu relatório de 16.02.1881, p. 37, destacaria também -- além da fábrica de sabão e velas do coronel J.A.Pereira Alves -- algumas fábricas de cerveja na capital.

(69) Relatório do presidente Rodrigo Octavio de Oliveira Menezes de 31.03.1879, p.21. O mesmo relatório trata, na seção sobre “Colonização” (p.69), das “colônias particulares” Pereira e Eufrasina, ambas no município de Paranaguá, de propriedade da firma Pereira Alves, Bendaszesky e Cia, dirigidas pelo coronel José Antonio Pereira Alves, gerente da empresa. Na colônia Pereira havia famílias italianas e na Eufrasina, francesas. Porém em ambas as colônias as famílias nacionais eram majoritárias (em 1877 o governo rescindiu o contrato que tinha com essa empresa para a introdução de imigrantes).

(70) DD de 6.10.1869- p.3

(71) Relatório do presidente A. L. Affonso de Carvalho de 15 de fevereiro de 1870, p. 24 

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