quarta-feira, 15 de agosto de 2012


6.2- (cont.)
Florêncio José Munhoz
 (Fonte: álbum de família)
Julieta Soares Gomes Munhoz
(Fonte: álbum de família)
          Florêncio José Munhoz, meu bisavô, tomou o nome do pai de CJM. Nasceu em Curitiba no dia 21 de dezembro de 1857 (180). Nos anos de formação, estudou em Curitiba e depois no Seminário Episcopal de São Paulo. Abandonando os estudos eclesiásticos, ingressou na Tesouraria de Fazenda do Paraná -- seguindo o exemplo de seus irmãos Alfredo e Caetano Alberto -- inicialmente como “praticante”, ocupando logo depois, mediante concurso, o cargo de 2º escriturário. Em agosto de 1890 foi transferido, nesse mesmo cargo, para a Alfândega de Paranaguá, subordinada, como a Tesouraria, ao Ministério da Fazenda (havia ainda, como suas unidades descentralizadas na província, as Mesas de Renda e as Coletorias). Um artigo de Francisco Negrão (181) -- que também era escriturário em 1890 -- o menciona como um dos onze em atividade na Alfândega, sob a chefia do Inspetor David Antônio Carneiro. F. Negrão informa ainda que Caetano Alberto Munhoz -- o irmão de Florêncio -- foi nomeado Inspetor dessa Alfândega em 1º de julho de 1890, mas só assumiu o exercício do cargo em 20 de abril de 1891, tendo o deixado em 11 de setembro do mesmo ano. Retornando para S.Paulo, ele se aposentaria em 1892 na Inspetoria de sua Tesouraria de Fazenda, como vimos. Naquele período, portanto, Florêncio esteve subordinado a esse seu outro irmão, convivendo com ele em Paranaguá.

Na época da Revolução Federalista, Florêncio tomou partido a favor dos antiflorianistas (“maragatos”), certamente influenciado pelo círculo social que frequentava nessa cidade e também pelo tenente-coronel Theophilo Soares Gomes, meio-irmão de sua esposa Julieta e um dos líderes do movimento revolucionário no Paraná (chegou a exercer o governo do Estado por alguns dias, em janeiro de 1894- v. a Cronologia Biográfica dele que elaborei e disponibilizei em http://tsoaresgomes.blogspot.com/). Com a consolidação de Floriano no poder, Florêncio sofre as consequências da sua opção política, e é demitido da Alfândega de Paranaguá em 1894 “por traição à República”, como consta no respectivo decreto do governo central, juntamente com alguns colegas. Mais tarde, porém, é reintegrado aos quadros da Alfândega. Em 1900 seu nome é citado no “Almanaque Paranaense” (p. 146), como 1º escriturário da Alfândega de Paranaguá. Nesse mesmo ano ele assina ata relativa à inauguração do novo edifício do hospital da Santa Casa de Misericórdia de Paranaguá, a cuja irmandade pertencia (assim como já pertencera seu avô homônimo). Posteriormente, ocupa o cargo de “guarda-mor”, exercendo tais funções em Paranaguá, Maceió e Santos, onde vem a falecer em 13 de novembro de 1909 (182). O casal teve cinco filhos: Hermínia (1883-1966), Franklin (1887-1912), Arabela (1890-1982), Georgeta (1894-1945) e Evelina (1895-1961). Arabela casou com o coronel Sílvio van Erven, chefe da Casa Militar e Chefe de Polícia no governo Manoel Ribas (antes do Estado Novo). O escritor Herbert Munhoz van Erven (1908-1985), meu pai, é filho desse casal.    

No jornal “Dezenove de Dezembro” encontrei as seguintes referências a Florêncio, a primeira delas quando era ainda adolescente:
 
  A edição do DD de 4 de dezembro de 1872, p.2, publica relação dos alunos que obtiveram “aprovação plena” nos exames realizados no dia 30 do mês anterior,

na escola da 1ª. cadeira do sexo masculino desta capital, sob a presidência do Sr. inspetor paroquial, sendo examinadores os Srs. tenente-coronel João Manuel da Cunha, reverendo Antonio Vicente da Cruz e o respectivo professor.

Dentre os alunos aprovados constam os nomes de Florêncio José Munhoz e José Caetano Munhoz.  Florêncio tinha então 15 anos. Seu irmão José Caetano era dois anos mais novo.

Concluída a educação primária, Florêncio mudaria para S.Paulo para estudar as matérias do ensino secundário no Seminário Episcopal. Confirma tal informação, que já me havia sido transmitida pela tradição familiar, a nota abaixo, publicada no DD de 9 de maio de 1877- p. 4:

CHEGADA- Chegou a esta capital, vindo de S.Paulo onde se achava concluindo os preparatórios, o Sr. Alberto José Gonçalves, filho do negociante desta praça Francisco José Gonçalves. Tivemos ocasião de ler os atestados que esse nosso patrício trouxe do seminário, os quais são presságio de auspicioso futuro. Chegaram também os Srs. Antonio Carlos Ribeiro e Florêncio José Munhós, estudantes do mesmo seminário.

Dois meses e meio depois, em 25 de julho de 1877, falecia CJM, repentinamente. Teria Florêncio retornado ao Seminário antes desse fato? O certo é que abandonou os estudos eclesiásticos, nessa ocasião ou em outra,  conservando-se porém muito católico.     

     O jornal “Diario do Commercio”, de Curitiba, em 12 de março de 1891, publicou o seguinte anúncio:

Florêncio José Munhós manda celebrar uma missa por alma de seu amigo e padrinho padre Carlos Maria Terrier, falecido no Rio de Janeiro.
Antonina, 11 de março de 1891

  Pesquisando na internet, verifiquei que Carlos Maria Terrier era um capuchinho francês que veio para o Brasil a fim de integrar o Seminário Episcopal de São Paulo. Os capuchinhos franceses foram os fundadores e primeiros mestres daquele Seminário, de 1854 a 1878, quando então o Seminário passou para padres seculares (comparando as datas, verifico que Florêncio  participou assim dessa primeira fase do Seminário). A igreja de São Cristóvão situada na avenida Tiradentes nº 84 no bairro da Luz, região central de São Paulo, fazia parte do Seminário Episcopal, que abandonou o prédio aí localizado em 1927 (183).

No Seminário de S. Paulo estudaram destacadas figuras paranaenses tais como o Monsenhor Manoel Vicente (1851-1909), que depois passou a lecionar lá e chegou a ser seu Vice-Reitor;  D. Alberto José Gonçalves (1859-1945), antes referido, político (foi deputado provincial e senador), vigário de Curitiba e depois  bispo de Ribeirão Preto; o escritor Moisés Marcondes (1859-1928); Alcides Munhoz (1873-1930), ensaísta e dramaturgo (184). Também foi aluno desse Seminário o monsenhor Celso Itiberê da Cunha (1849-1930), nascido em Paranaguá mas por muitos anos cura da catedral de Curitiba, irmão do compositor e diplomata Brasílio Itiberê, ambos filhos do primeiro casamento do Dr. João Manoel da Cunha (antes citado como examinador de Florêncio) com D. Maria Lourença Munhoz da Cunha (185) (a propósito desta, embora nascida em Paranaguá e de sobrenome Munhoz, F. Negrão não a menciona na “Genealogia Paranaense”; devia pertencer aos Munhoz de origem mais antiga no Brasil, diferentemente dos ancestrais de CJM).

  Em 1880, aos 22 anos, Florêncio ingressa na Tesouraria de Fazenda na província do Paraná como “praticante” (186). No ano seguinte, em 26 de fevereiro, ele e Arthur de Menezes Dória, outro praticante, são nomeados “para exercerem provisoriamente os lugares de 2ºs escriturários” que se achavam vagos naquela repartição (187).  Anteriormente, em 11 de fevereiro, o presidente nomeara os seguintes examinadores para avaliar, nas disciplinas abaixo, os pretendentes às duas vagas de 2º escriturário existentes naquela Tesouraria: I) aritmética e sistema métrico- Eng. Gottlib Wieland; II) álgebra- dr. Francisco Antônio Monteiro Tourinho; III) escrituração mercantil- cap. Joaquim Lourenço de Sá Ribas; IV) geografia e história do Brasil- dr. Constante Affonso Coelho; V) inglês- dr. Francisco de Camargo Pinto; VI) francês- dr. José Joaquim Franco Valle; VII) prática do serviço da repartição- 1º escriturário Antônio Ferreira da Costa (188).

Florêncio José Munhoz, juntamente com Arthur de Menezes Dória, aprovados nesses exames, seriam nomeados, por “títulos” de 19 de setembro de 1881, 2º escriturários da Tesouraria de Fazenda (189).  Uma nota publicada no DD de 21 de maio de 1881- p. 3 mostra que os concursos públicos de então eram diferentes dos do nosso tempo. Reservavam-se, prioritariamente, as vagas disponíveis para o pessoal interno das repartições governamentais. Diz a nota da Tesouraria de Fazenda do Paraná, assinada em 5 de maio, que se acha em concurso “novamente” uma vaga de 2º escriturário

para o qual se poderão apresentar os empregados de 1ª. entrância desta tesouraria e da alfândega de Paranaguá, podendo do mesmo modo inscrever-se pessoas estranhas às ditas repartições, caso o número daqueles concorrentes não exceda ao da vaga.

Em 1882, Florêncio foi nomeado “alferes” da 1ª. Companhia do 1º Batalhão de Reserva da Comarca da Capital da Guarda Nacional, conforme o DD de 25 de fevereiro desse ano, p. 3.  Florêncio pagou 40$000 de selo por essa patente, informa o DD de 4 de março, p. 3. Dois anos e alguns meses mais tarde, ele e Edmundo Soares Gomes (irmão de sua esposa?) constam de relação dos qualificados para o serviço ativo (cf. DD de 5 de julho de 1884, p. 3-4).   

O “Dezenove de Dezembro” também mostra que Florêncio se interessava pelo convívio social.  Ele integrou, como 2º secretário, a diretoria, para o segundo semestre de 1881, da recém-formada sociedade “Cavalheiros do Luar(190). O presidente da sociedade é o tenente Benedito Pereira da Silva Carrão (suponho que o mesmo Benedito Carrão que redigia a “Gazeta Paranaense” (fundada em 1876), órgão do Partido Conservador, e também “O Paranaense”, em 1879-80,  com Justiniano de Mello e Silva). O 1º secretário é o alferes Miguel Schleder e o orador, Manoel de Souza Dias Negrão, cunhado de Florêncio (casado com sua irmã Augusta). Havia ainda um tesoureiro, um Conselho Econômico e uma Junta Consultiva. Nos dias 6, 9 e 27 de julho de 1881 o jornal publica convites para os sócios participarem de reuniões nos dias subsequentes. No último deles a sociedade é identificada como “S.L.R Cavalheiros do Luar” (191). Logo ficamos sabendo pelo jornal (192) o significado de todas as letras por uma carta, procedente de Barbacena, do Dr. Abílio César Borges (o conhecido educador, retratado caricaturalmente em “O Ateneu” de Raul Pompéia) dirigida à entidade, em que ele louva a idéia da criação da sociedade literária recreativa Cavalheiros do Luar e lhe oferta 500 exemplares de sua obras. Uma semana depois, pelo DD (193), a S.L.R. Cavalheiros do Luar comunica “aos sócios e convidados que a 4ª. partida (194) terá lugar sábado, 13 do corrente, no salão Lindemann, à rua de S.Francisco”. E conclui assim o aviso: “Pede-se toda abstenção de luxo” (essa era uma recomendação usual, indicando que devia haver preocupação excessiva dos convidados com a sua aparência, nessa Curitiba provinciana, de pouca vida social). 

Outra edição do DD informava que na segunda-feira, dia 15 de agosto, no mesmo salão Lindemann teria lugar “o último concerto vocal e instrumental dado pelo artista lírico Scolari Giovani, coadjuvado por algumas senhoras e cavalheiros amadores” (195). No ano seguinte, 1882, esse salão receberia a Companhia Dramática Julieta dos Santos, que levou à cena ali o poema “O Melro” de Guerra Junqueira, além de um drama e uma comédia. O jornal (196) que traz matéria sobre essas apresentações, ocorridas em 29 de outubro, um domingo, salientaria o “magistral desempenho dado pela atrizinha Julieta dos Santos ao idílio- O Melro”. Também “O Porvir” de 31 de outubro de 1882- p.3 contém matéria elogiosa sobre a apresentação dessa companhia, destacando a participação de Julieta na peça “Georgeta a cega” (em que ela faz o papel da cega), além de “O Melro”. Foi a essa Companhia que o nosso maior poeta simbolista, Cruz e Souza, quando jovem (com vinte e poucos anos), se integrou, na condição de ponto, percorrendo todo o Brasil, de norte a sul. Dada a sua grande admiração pela atriz-menina, chegou a publicar vários sonetos sobre ela (197). 

Antes de Curitiba, Julieta dos Santos se apresentou em nosso litoral. “O Porvir” de 7 de setembro de 1882, na p. 4, informa que brevemente chegaria a Paranaguá a companhia dramática de Moreira de Vasconcellos

da qual faz parte a célebre rio-grandense Julieta dos Santos, menina de 9 anos de idade, que tem revelado um gênio na arte dramática, tendo por isso colhido inúmeros aplausos das platéias e da imprensa fluminense.

A edição do dia 30 de setembro do mesmo jornal informa que ela estava então se apresentando em Antonina. Alguns anos mais tarde, “O Futuro” de Paranaguá, edição de 7 de novembro de 1885- p.2, anunciava seu retorno à cidade. 

A pequena atriz causou tão boa impressão no meio curitibano que deu nome a uma sociedade dramática que os amantes do teatro, inclusive Florêncio, fundaram nessa época, como se verá abaixo. 

Em 1880, Florêncio (empregado como “praticante” da Tesouraria de Fazenda) casou com outra Julieta, a filha do comerciante português Manoel Soares Gomes (1829-1891), estabelecido na rua do Rosário “canto do Largo da Matriz” desde 1877 (198), e de D. Rita Adelaide Coutinho (1838-1911).

Antes de prosseguir, gostaria de incorporar aqui algumas informações que obtive sobre Manoel Soares Gomes -- importante no comércio da época e membro de destaque da comunidade lusa local -- ampliando assim a nossa visão de Curitiba no tempo do Império.   
Fonte: Casa da Memória


Manoel Soares Gomes
               (Fonte: álbum de família)
Rita Adelaide Coutinho Soares Gomes
(Fonte: álbum de família)


Julieta Soares Gomes Munhoz
(Fonte: álbum de família)

O sogro de Florêncio nasceu na cidade do Porto em 1829 e emigrou para o Brasil ainda jovem. Casou aqui com D. Maria Gonçalves Moraes Soares, nascida na província de Santa Catarina, filha do tenente-coronel Bento Gonçalves de Moraes Cordeiro. Aos 24 anos residia na vila de Antonina, onde nasceu seu filho Theophilo. 

Por anúncios publicados no jornal “Dezenove de Dezembro” depreende-se que houve uma sociedade entre Manoel Soares Gomes e Domingos Solis Garcias, que durou de janeiro de 1855 a agosto de 1856, aquele residente em Antonina e este em Curitiba. Essa sociedade, denominada “Soares & Garcias”, mantinha um armazém “de secos, molhados e ferragens”, situado na rua da Carioca (atual Riachuelo) nº 27, em Curitiba, gerenciado por Garcias.  Mas edições do mesmo jornal de abril e julho de 1856 publicam anúncio de uma casa de relojoaria e jóias de Manoel Soares Gomes em Paranaguá, onde também consertavam-se relógios e caixas de música.

Em 1864, Manoel casou em 2as. núpcias com D. Rita Adelaide Coutinho no Desterro, atual Florianópolis. O casal teve três filhos: Julieta, aí nascida em 1866, Edmundo e Franklin (este nascido no Rio de Janeiro em 1872).

O “Dezenove de Dezembro” registra, em notas relativas ao movimento do porto de Paranaguá, a presença de Manoel Soares Gomes dentre os passageiros de navios procedentes do Desterro e Rio de Janeiro ou com destino a essas localidades.

Em 1877 Manoel estava estabelecido comercialmente em Curitiba. A “Província do Paraná”, na edição referida acima, de 17 de outubro, publica anúncios de sua casa importadora, estabelecida na rua do Rosário, junto à atual praça Tiradentes.  Por outro lado, a edição de 16 de dezembro desse mesmo ano, p.4, de “O Paranaense”, anuncia que M.Soares Gomes e Cia oferecem ao público “uma grande e profusa coleção de artigos importados dos Estados Unidos para uso do comércio, indústria, lavoura, artes, ciências, economia doméstica etc etc”, artigos esses que poderiam ser vistos em seu armazém em Curitiba.

Em outro anúncio, publicado em “O Paranaense” de 10 de janeiro de 1878- p. 4, consta o seguinte: 

Manoel  Soares  Gomes  e  Comp. --  únicos  agentes na Província do Paraná da Companhia Lidgerwood,  fabricantes  nos  Estados Unidos  e  Inglaterra – tem  sua  casa  na  travessa  da  rua  do  Rosário,  e  vende  baratíssimo  máquinas  e  instrumentos agrícolas de todos os sistemas e formas que o progresso nos tem   apresentado  e  artigos  americanos,  como  sejam: cadeiras, mobílias, relógios, trolles, carrinhos, pianos, arados, debulhadores, querosene, farinha, lampeões e grande  infinidade de  objetos que seria longa a sua enumeração. 

No ano seguinte, o “Dezenove de Dezembro” de 30 de janeiro de  1879 traz anúncio (em alemão) dos vendedores de farinha de trigo Amazonas M. & Oliveira e M. Soares Gomes & Cia. Também no “Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Província do Paraná para 1880” organizado por José Ferreira de Barros, Rio de Janeiro, 1879, p. 109, consta dentre os comerciantes (secção “Objetos Americanos”) o nome da firma “Soares Gomes & Cia”.

Ainda em “O Paranaense” (edições de 9 e 14 de setembro de 1879,         ambas na p. 4),  constam anúncios de M.Soares Gomes e Cia, relativos à       venda de máquinas de tijolos e telhas (a serem movidas por animais) assim como fogões (americanos e nacionais), arados, moinhos, bombas, carneiros hidráulicos, louça de cozinha, além de máquinas de Singer   (“para uso de famílias, alfaiates, sapateiros, seleiros etc”), máquinas a vapor, máquinas de picar capim etc., cujos únicos agentes aqui eram M.Soares Gomes e Cia.   

Em 1880, quando D.Pedro II inaugurou em Curitiba o edifício do Hospital da Santa Casa de Misericórdia, Manoel estava presente à cerimônia. Foi uma das 162 pessoas que assistiram o ato e assinaram a respectiva Ata, transcrita por Francisco Negrão em “Memória da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba”- Curitiba, 1932, p. 21.

Mais tarde, em 1888, a “Gazeta Paranaense” publica, na edição de 12 de julho, correspondência enviada ao jornal por um grupo de 10 empresários -- liderado pelo Barão do Serro Azul e integrado por Manoel Soares Gomes -- que reivindica a criação de um banco para a Província do Paraná, projeto proposto por Frederico Perracini. 

Em 1889, na “Galeria Ilustrada” nº 15, de 10 de junho, consta anúncio de M.Soares Gomes, referido como “importador de máquinas a vapor, máquinas de costura, mobílias, instrumentos de lavoura e artigos de ferragem, louça, porcelanas, cristais etc. dos Estados Unidos”.

Ainda em 1889, mas após a proclamação da República, o nome de Manoel Soares Gomes aparece no topo de um rol de cem comerciantes que encaminham documento ao governador Francisco José Cardoso Jr. felicitando-o pelo modo como conduziu o Estado -- mantendo o “princípio de autoridade” e assegurando a “ordem pública” -- por ocasião dos acontecimentos políticos que acabavam de ocorrer (instauração da República). Segundo o historiador David Carneiro, tal movimento daria como resultado a criação da Associação Comercial do Paraná, ocorrida em julho de 1890.

Manoel Soares Gomes faleceu em Curitiba em 1891, aos 62 anos incompletos.

Sua filha Julieta, como disse, nascera no Desterro em 1866. Quando casou, em 11 de outubro de 1880, tinha apenas 14 anos enquanto Florêncio José Munhoz, 22. O casamento foi realizado em cerimônia quase secreta, pois não contava com o apoio da família, segundo ouvi em casa. Na realidade, não devia contar com o apoio dos pais da noiva, pois os de Florêncio já haviam morrido. Além disso, verifiquei nos assentamentos em livro próprio, no acervo da Catedral Metropolitana, que o casamento foi celebrado pelo padre Jordão Homem Pedroso e ocorreu na capela de N.Sra do Rosário “que serve de Matriz a esta paróquia de Curitiba, donde os contraentes são fregueses”. Foram testemunhas o tenente-coronel Antonio Ricardo Lustosa de Andrade e o tenente Caetano Alberto Munhoz, tudo conforme os registros feitos mais tarde (em 25 de março de 1882) no livro de casamentos pelo padre Júlio Ribeiro de Campos, Vigário Geral Forense (que tinha competência para dispensar os proclamas, e outras formalidades).

Esse padre era amigo do noivo. Ele também estudara no Seminário Episcopal de S.Paulo, alguns anos antes de Florêncio. Fora nomeado pelo bispo da Diocese de S.Paulo, em 2 de abril de 1879, o primeiro Vigário Geral Forense” da província do Paraná, cuja escolha recaía assim sobre um sacerdote nascido na capital (Curitiba só viria a ser sede de bispado em 1892) (199). Dentre as suas atribuições, constava a de “dar o seu parecer sobre a conveniência da criação e extinção de paróquias e sobre a alteração de limites das mesmas, ficando dependente da autoridade diocesana a instituição ou aprovação canônica respectiva”, conforme consta no relatório do presidente Manuel Pinto de Souza Dantas Filho de 16 de fevereiro de 1890, p.24. 

O padre Júlio faleceria em 1885, com apenas 35 anos de idade. Florêncio foi uma das pessoas que o assistiram no leito de morte, conforme consta em matéria publicada no “Dezenove de Dezembro” de 12 de abril desse ano, p. 1-3 (na edição do jornal do dia anterior, p. 4, é Florêncio quem convida amigos e parentes para a missa a ser rezada pela alma do padre Júlio)..  

   Julieta era meia-irmã de Teophilo Soares Gomes (1854-1935), o político “maragato” e dramaturgo paranaense, filho do primeiro casamento de seu pai.   Menos de um ano antes de seu casamento, ela é referida numa nota da “Província do Paraná” de 2 de dezembro de 1879- p.2 que transcreve um convite de um grupo de “jovens paranaenses desta capital” para um baile oferecido ao presidente da província Manoel Pinto de Souza Dantas Filho, como “manifestação de apreço e reconhecimento”/.../ “pelos benefícios que há feito e interesse que tem demonstrado em relação ao Museu desta capital”. O baile, aliás, será realizado “no novo e vasto salão do Museu”. As moças que assinam o convite são: Francisca de Menezes, Júlia Godoy, Maria Eugenia Ramos, Escholastica Enéas, Maria Martins, Bertholina Silva, Rosa da Fonseca, Escholastica Gonsalves, Maria da Conceição Lustosa, Maria Augusta Franco, Maria Clara Pinheiro, Maria Candida Castro, Francisca Eufrasina d’Assumpção, Joaquina Francisca de Andrade, Julieta Soares e Maria Barbara de Leão.  A edição do mesmo jornal do dia 10 de dezembro, p.2, faz um relato do baile, realizado no dia 8, a partir das 8 horas da noite. “Foi uma reunião esplêndida pela concorrência, arranjo do salão e serviço do chá”. Nesse texto, a matéria refere-se à “exma. sra. do sr. Soares Gomes” (D. Rita Adelaide) que fez o bouquet (“um primoroso trabalho”) entregue ao presidente Dantas por uma das jovens integrantes da comissão de recepção.

O DD de 12 de setembro de 1883, p.2, refere-se de forma elogiosa aos espetáculos teatrais promovidos pelas sociedades Grupo de Amadores e Julieta dos Santos. Na p.3 o jornal informa a composição da nova diretoria (eleita) da Sociedade Julieta dos Santos. Florêncio José Munhoz figura aí como vice-presidente. O presidente é João Bernardino Carneiro, o 1º secretário José Craveiro de Sá, o 2º secretário Firmino Castello Branco, o tesoureiro Horácio F. dos Reis e o procurador Maximiano José Martins. Logo abaixo, na mesma página, consta matéria elogiosa sobre os dois espetáculos (um drama e uma comédia) dados por essa sociedade, nos dias 7 e 8 de setembro. João Carneiro e Horácio Fagundes, membros como vimos da diretoria, são dois dos seis atores que participaram das encenações. É possível que Florêncio, então com 25 anos,  também fizesse teatro. Afirma a matéria do “Dezenove de Dezembro”:

/.../ É bem difícil uma mocidade ainda noviça no manejo da arte de Thalia se mostrar vigorosa nesses arrobos (sic) que, pela fantasia, nos deixa ver a realidade dos atos da existência humana. Parabéns a esses belos moços que se mostram corajosos de querer firmar o espírito social, implantando a verdadeira emulação na sociedade presente e futura.

 Aproximadamente um mês mais tarde, em outubro, o jornal (200) publica esta nota, relativa a novas apresentações da sociedade:

Espetáculo- A sociedade dramática particular Julieta dos Santos levou à cena, no dia 7 do corrente, o drama José, a cena cômica O sacristão de S. Nunes e a comédia Os dois criados felizes, destinando o seu produto à compra de paramentos para a igreja matriz.  Foi bastante concorrido.

Florêncio pertencia à Irmandade do SS. Sacramento da Matriz de Curitiba. Nessa condição, participava da “guarda do Senhor” na Semana Santa, conforme o costume da época. No DD de 17 de março de 1883, p. 4, consta nota dessa Irmandade contendo a “Relação dos respectivos irmãos que têm de fazer a guarda do Senhor”. Os membros da Irmandade que ali constavam, aos pares, seriam substituídos, a cada duas horas, por outros dois, desde o meio-dia da quinta-feira santa até as 12 horas da noite da sexta-feira. Na quinta-feira, das 12 às 2 horas da manhã, faria a guarda Florêncio José Munhoz e Antônio Carlos Ribeiro de Andrade (seu antigo colega do Seminário de S. Paulo); das 2 às 4 horas da manhã, Alfredo Caetano Munhoz (seu irmão) e Manoel de Souza Dias Negrão (cunhado de Alfredo). Outros nomes citados nessa relação: Dr. José Lourenço de Sá Ribas, Dr. Generoso Marques dos Santos, ten-cel Benedito Enéas de Paula, Dr. Agostinho Ermelino de Leão, Dr. Joaquim de Almeida Faria Sobrinho etc. No ano seguinte, conforme o DD de 10 de abril de 1884, p. 4, dentre os diversos pares referidos, consta aquele formado pelo major Mathias Taborda Ribas (tio de Florêncio, casado com Balbina Lúcia, irmã de CJM) e ten-cel Manoel José da Cunha Bittencourt. 

Em 1884, Florêncio, com a esposa Julieta, juntamente com seu irmão Alfredo (dirigente local da Tesouraria de Fazenda), esposa (D.Rita de Assis de Oliveira Munhoz) e filha, Francisca Munhoz, participam de uma grande festa da elite curitibana, objeto de duas extensas matérias numa mesma edição do DD (201).  A festa -- uma “soirée travestie” como a chama o cronista, em seu texto recheado de expressões em francês -- realizou-se no dia 23 de junho na residência do coronel Carlos Vieira da Costa e de sua esposa D.Zelie Costa, “diretora do colégio de Santa Tereza” (o pai de Zelie, professor Christovão Vieira de Freitas, também está presente; ele é mencionado como “o infatigável sacerdote da educação secundária no Brasil”). O “baile à fantasia” realizou-se nos amplos salões da residência do casal e ali “um grupo adorável de rostos alegres e felizes /.../ voava nas asas douradas das valsas, das polcas, dos lanceiros, das quadrilhas e das mazurcas”. Assentada ao piano estava D. Presciliana Costa, “a quem muito deve esta cidade pela aclimação de uma escola estética de canto”. Junto dela, duas alunas, Elvira Costa, contralto, e Rosa Fonseca, soprano, executaram, na ocasião apropriada, um dueto da “Fosca” de Carlos Gomes, seguida mais tarde de outro dueto, de “Il Guarani” (é possível que Julieta, a esposa de Florêncio, que estudou canto lírico, conforme a tradição familiar, também tivesse sido aluna de D. Presciliana Vieira da Costa. A propósito, sua escola era uma das sete particulares existentes na capital em 1879; possuía então 7 alunos do sexo masculino e 17 do feminino (cf. Anexo A do relatório do presidente Manuel Pinto de Souza Dantas Filho de 16 de fevereiro de 1880). O cronista descreve em detalhe as “toilettes” e fantasias das convidadas, uma a uma. Estes os comentários que faz aos membros da família Munhoz:

-Mme. Julieta Munhoz. A bela Filha da Hungria: robe satin bleu ciel à manchettes blanches. Dentelles d’Angleterre. Bouquet de roses dr. Enault no colo. Uma esplêndida capa guarnecida de pelúcia. Na cabeça, um gorro branco com plumas. Colar de pérolas ao pescoço e um elegante éventail de penas. Éblouissante e edênica.
-Mme. Munhoz: robe satin bleu mer. Simpática, amável e spirituelle.   
-Mlle. Francisca Munhoz. A Italiana.: robe rouge bordado a ouro. Corpete verde. Na cabeça, um lenço escarlate. Angélique et splendide

Dentre as fantasias adotadas pelas senhoras e senhoritas, são mencionadas: a Folia, a Noite, a Gondoleira, a Italiana, a Húngara, a Feiticeira Cartomante, Joana d’Arc, o Telégrafo, a Costureira, a Justiça, a Jurisprudência e a Camponesa.  Dentre os cavalheiros, havia a presença de um Napoleão I, um rei Luis XIV e de o Espanhol. Além dos já mencionados, estavam presentes o comendador Ildefonso Correa, o chefe de polícia Dr. Walfrido, Jesuíno Lopes (diretor do “Dezenove de Dezembro”), Dr. Westphalen, coronel Assumpção etc. A festa, que teve um buffet caracterizado “pela diversidade de bebidas e por infinita qualidade de doces”, prolongou-se até às 4 horas da manhã.

O anfitrião, Carlos Vieira da Costa, integrava a Delegacia da Inspetoria Geral da Instrução Pública da Corte na província do Paraná pois assina edital da secretaria dessa Delegacia publicado no jornal  no começo de julho de 1884 (202).  Esse edital divulga relação dos inscritos para os “exames gerais de preparatórios” a serem realizados proximamente (a aprovação neles era pré-requisito para o acesso aos cursos superiores do Império). Francisca Cândida Munhoz, filha de Alfredo, inscreveu-se em português, francês e geografia, e nessas matérias seria “aprovada plenamente com distinção” (ela prestou esses exames “perante a delegacia da instrução primária e secundária” da Corte) (203). No ano seguinte, também seria “aprovada plenamente” em inglês e aritmética (204). Francisca era aluna do “acreditado” colégio Santa Tereza, dirigido por D. Zelie Costa, esposa de Carlos Vieira da Costa (205).

No mesmo ano de 1884, o DD de 9 de dezembro, p. 4, traz matéria sobre outra soirée, esta realizada no dia 7 e “ofertada” pelo Cel. Vieira da Costa ao “estado-maior de S.A. o Sr. Conde d’Eu”, então em visita ao Paraná (ele e a princesa Isabel inaugurariam a estrada-de-ferro Curitiba-Paranaguá). Compareceram oficiais do 3º Regimento de Artilharia e 2º Corpo de Cavalaria com suas famílias, “bem como grande número de damas e cavalheiros de nossa mais escolhida sociedade”. /.../ “A soirée, de acordo com o gosto moderno, constou alternadamente de dança, música e canto”. A Sra. Tamplin, “conhecida professora de música”, fez-se ouvir ao piano, enquanto outras senhoras “cantaram trechos de diversas óperas”, conforme programação aí transcrita, que incluiu “Amore, valsa para canto, por Julieta Munhós”.  Além das já citadas, a nota menciona as senhoras Elvira Costa, Rosa Fonseca, Graça Fonseca, Francisca Menezes, Zelie Costa e Júlia Godoy (muitas delas referidas antes, no convite ao baile em homenagem ao presidente Dantas Filho, realizado cinco anos atrás. Em fevereiro de 1885, os nomes de algumas constam numa matéria assinada pelo presidente do Club Abolicionista Paranaense, Castro Lavor, publicada no DD (206), que relaciona senhoras e cavalheiros que se dispuseram a angariar prendas para as quermesses a serem realizadas em março, visando levantar fundos para emancipar escravos. Como se vê, nessa época essa questão, embora tardiamente, já sensibilizava a elite local). 

Florêncio foi vítima de perseguição política, o que ocorria tanto em governos liberais como conservadores.  No caso, ocorreu no tempo do presidente Brasílio Machado, do Partido Liberal, a julgar pelas afirmações do deputado Manoel Euphrasio Correia em um discurso pronunciado na Assembleia Geral e publicado em 19 de julho de 1885, p.1-3, pelo semanário “O Futuro”, de Paranaguá, que apoiava o Partido Conservador. Florêncio teria feito um comentário que Brasílio não gostou, em reunião particular, sobre o empenho do presidente em eleger seus candidatos liberais às duas vagas da província do Paraná na Assembleia Geral (ou Câmara dos Deputados). Em razão disso, ele procura afastá-lo da Tesouraria e do meio local, mandando-o apresentar-se no Ministério da Fazenda, no Rio de Janeiro. Alfredo, chefe do irmão, envia oficio ao presidente encaminhando pedido de Florêncio para que ele reconsidere sua decisão. Mas este é o despacho do presidente Brasílio, datado de 19 de novembro de 1884 e publicado no “Dezenove de Dezembro” (207):    

Ao inspetor da tesouraria de fazenda- Declaro a v.s., em resposta ao seu ofício de hoje, que, não achando atendível o pedido feito pelo 2º escriturário dessa repartição Florencio José Munhós, fica-lhe marcado o prazo de 24 horas, sob as penas da lei, a fim de seguir ao seu destino.   

Brasílio, em dois outros despachos que constam no mesmo “Expediente da presidência”, manda lhe darem passagens para todo o trajeto, de diligência de Curitiba a Antonina, e de navio a vapor, “por conta do ministério da fazenda, até à Corte”, a fim de viabilizar a sua decisão.  Florêncio não cumpre a determinação do presidente, preferindo apelar diretamente ao conselheiro Dantas, chefe do gabinete imperial e também do Partido Liberal, cujo filho fora presidente da província do Paraná, a quem a família de sua esposa era ligada politicamente. Ele lhe responde por “um telegrama ambíguo”, segundo Euphrasio Correia, que não resolve o impasse. O presidente Brasílio então o suspende do exercício do cargo de escriturário da Tesouraria a partir de 21 de novembro de 1884, responsabilizando-o pelo crime do art. 154 do Código Criminal do Império (208). Em consulta a esse Código, verifiquei que tal artigo, contido no Título dos crimes da administração pública e no Capítulo relativo aos empregados públicos, trata do descumprimento de ordem superior, prevendo pena de 1 a 9 meses de suspensão.

Brasílio em seguida encaminha o processo ao juiz de direito da comarca a fim de que “torne efetiva aquela responsabilidade criminal” (cf seu despacho no “Expediente da presidência” de 23 de dezembro de 1884, publicado no DD do dia 30, p.1). O caso se encerra com a decisão do Tribunal de Relação favorável a Florêncio. O Tribunal decide pela “não pronúncia” dele, por unanimidade, deixando sem efeito assim a sua suspensão da Tesouraria. É o que noticia “O Futuro” de 3 de maio de 1885, p.2. Mais tarde, na edição de 19 de julho, p.1-3, o jornal transcreve o discurso de Euphrasio Correia proferido na sessão de 6 de julho, em que relata o episódio e nos forneceu as razões para os despachos que constam no “Dezenove de Dezembro”. Euphrasio diz ali que as medidas do presidente eram “para incutir o desânimo no espírito de meus amigos”, chama Florêncio de “distinto empregado da Tesouraria Geral”, de “honrado escriturário”, e critica (corretamente, a meu ver) Brasílio por “tomar uma vingança, pequena e infeliz” contra ele.        

Em 1887, Florêncio continuava a integrar a equipe de funcionários da Tesouraria da Fazenda, em Curitiba, subordinado a seu irmão mais velho, de acordo com citação de seu nome numa carta dos funcionários de Alfredo Munhoz, em que estes o cumprimentam pelo aniversário (209).

No final do Império, o DD de 15 de outubro de 1889- p.3 publica edital da Tesouraria, assinado por Florêncio, na condição de secretário da “comissão das estradas estratégicas do Paraná”, comunicando que aquela repartição receberá propostas para o fornecimento, à força (do Exército) que acompanha tal comissão, dos gêneros alimentícios e outros arrolados em anexo ao edital, “organizado pelo Chefe da Comissão” (os fornecedores deverão transportar esses gêneros de Curitiba para “Porto da União” e  Guarapuava, ou além). Mas logo após a instauração da República, o governo provisório resolve “fazer recolher à capital federal o chefe da comissão encarregada da fundação da colônia militar na foz do rio Iguaçu e da abertura de estradas estratégicas neste Estado” (cf. DD de 7 de dezembro de 1889- p.2). A colônia já estava fundada em novembro de 1889, conforme o relato do sarg. José Maria de Brito, da expedição militar que veio para o Paraná em 1888 sob o comando do cap. Belarmino de Mendonça com tais objetivos (210).

A primeira dessas “estradas estratégicas” deve ter sido a de Porto da União a Palmas, referida no relatório do presidente Brasílio Augusto Machado d’Oliveira de 15 de setembro de 1884, p. 19. Ele informa aí que já estava na província a comissão militar dirigida pelo engenheiro capitão Belarmino Augusto de Mendonça Lobo encarregada (pelo governo central) de abrir uma estrada de rodagem entre Porto da União e a vila de Palmas, “há muito reclamada por interesses de ordem militar, política e industrial”. Naquela época, essa ligação era apenas “um caminho de cargueiros, de trânsito muito difícil e moroso”. 

Em uma nota datada de 12 de dezembro de 1889 publicada no DD (211), o vigário da matriz de Curitiba Pe Alberto José Gonçalves, diretor da “Congregação de N.Sra da Luz”, nomeia Florêncio procurador da entidade, encarregado da cobrança dos seus “anuais”. As outras pessoas então nomeadas para a diretoria dessa Congregação foram: provedor: Dr. Trajano Joaquim dos Reis; tesoureiro: capitão Sesinando de Sá Ribas; secretário: Gabriel Pereira; mesários: comendador Antônio Martins Franco, Augusto de Assis Teixeira, Ciro Veloso, Dr. Cristiano Ottoni Jr, major João Lustosa de Andrade, capitão Constante de Souza Pinto.      

Em 26 de agosto de 1890, Florêncio é nomeado 2º escriturário da Alfândega de Paranaguá, conforme está registrado no Diário Oficial da União dessa data (p. 9, seção 1), transferindo-se assim para essa cidade.    

                                                              *                 

José Caetano Munhoz, nascido em 4 de julho de 1859 (212), casou-se com Augusta Patusca. “Foi importante negociante em Santos”, segundo F. Negrão, que também informa que sua filha, Carlota, era “hábil pianista”, tendo realizado “um importante concerto musical em Curitiba em Dezembro de 1925” (213). Sobre ele diz Alcides Munhoz:  “José Caetano Munhoz, seguindo a carreira do comércio, após haver saído da Escola Militar do Rio de Janeiro, fora, a convite do Conde de Pinhal, Presidente do Banco de S. Paulo” (214).   

Aos 19 anos, em agosto de 1878, José Caetano encontrava-se domiciliado em Montevidéu segundo menção a ele no processo de inventário de seu pai, tratando de assuntos relacionados aos interesses dos herdeiros junto ao consignatário da erva-mate beneficiada nos engenhos de CJM, sediado na capital uruguaia (Silva & Irmão).

 Por uma menção, no DD de 29 de dezembro de 1880- p. 2, ao requerimento encaminhado ao governo provincial por José Caetano Munhoz, então com 21 anos, obtém-se a informação de que ele forneceu alimentos para os trabalhadores da estrada da Graciosa até agosto de 1880 (como CJM falecera em 1877, e no final de abril de 1879 ocorreu o incêndio de grandes proporções em seus engenhos, causando grandes prejuízos à família, suponho que essa foi uma das possibilidades econômicas então exploradas para obter renda. Outra seria a tentativa de seus membros de se estabelecerem comercialmente, como indica o seguinte anúncio, publicado em “O Paranaense” de 15 de fevereiro de 1880, p. 4:

Atenção
MUNHÓS IRMÃOS
participam que acabam de  abrir
uma casa especial de armarinho,
moda, perfumarias,  objetos  de
escritório e charutaria à
rua Fechada nº --

(também o DD de 21 de fevereiro de 1880, p. 4, publica anúncio semelhante).

José Caetano estudou no Instituto Paranaense (antecessor do atual Colégio Estadual do Paraná) que desde 1879 funcionava junto com a Escola Normal na rua Aquidabã (215). Ele é um dos 25 alunos signatários de uma “manifestação de júbilo e gratidão” dirigida ao presidente da província Carlos de Carvalho, publicada no DD de 5 de julho de 1882- p. 4.  Os estudantes elogiam a atitude do presidente de defender a continuidade da realização aqui dos “exames preparatórios” que o governo geral queria suspender, como medida de economia. Tais exames objetivavam ”preparar para os cursos superiores do império”.

Nota-se assim que os filhos mais novos de CJM estudaram em colégios de Curitiba, em seminário ou escola militar de outras cidades, ao contrário dos dois mais velhos (Alfredo e Caetano Alberto), que estudaram no colégio Köpke, em Petrópolis. Isso reflete certamente uma piora da situação financeira da família e também o maior desenvolvimento de Curitiba, ao oferecer mais oportunidades de estudo na própria cidade natal.  

Ainda em 1882, há mais duas menções a José Caetano Munhoz no jornal.

O DD de 2 de agosto desse ano, p. 3-4, publica o resultado dos “exames gerais de preparatórios” que se realizaram no mês anterior, de 17 a 24 de julho: José Caetano Munhoz foi “aprovado com distinção” em português e “aprovado plenamente” em geografia. Na mesma ocasião, o jovem Emiliano Perneta (1866-1921) foi “aprovado plenamente” em latim. 

O DD de 20 de setembro de 1882- p.1 informa a nomeação de José Caetano como tenente da Guarda Nacional (da 6ª. Companhia, do 1º Corpo de Cavalaria).

Depois de 1882 ele não é mais mencionado no jornal, exceto nesta nota publicada no DD de 27 de julho de 1888- p. 2:

Recebemos um folheto sob o título de “Balanço Mercantil”, produto do nosso inteligente comprovinciano Sr. José Caetano Munhoz, guarda-livros em Santos. Agradecemos a oferta.                                                             

Nesse intervalo de tempo, entre 1882 e 1888, José Caetano deve ter se mudado para Santos, onde já se encontrava Caetano Alberto desde 1883 (216).

                                                             *

Maria Leocádia Munhoz nasceu em 3 de dezembro de 1860 (217).  Casou-se em 1as. núpcias com o coronel Bento Munhoz da Rocha (seu primo, filho de Maria Lícia, irmã de CJM) e em 2as. núpcias com o coronel Manoel Bonifácio Carneiro. É filho de seu primeiro casamento Caetano Munhoz da Rocha (1879-1944), que foi presidente do Estado, pai do ex-governador Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-1973). Por aí se vê que eles eram, respectivamente, neto e bisneto de CJM.  

O DD de 14 de março de 1877- p.4 noticia o casamento realizado em “10 do corrente” entre Bento Munhoz da Rocha e Maria Leocádia, “filha do nosso amigo Sr. tenente-coronel Caetano José Munhós. Foram testemunhas do ato os Srs. Ildefonso Pereira Correia e major Bento Florêncio Munhós”. Ildefonso Pereira Correia receberia em 1889 (218) o título de Barão do Serro Azul. O major Bento Florêncio Munhoz, por outro lado, era irmão de CJM. Dediquei a ele a seção 6.6 deste capítulo.  

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